Edição 231 | 13 Agosto 2007

Morre Jean-Marie Lustiger, ex-arcebispo de Paris

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Jean-Marie Lustiger, nascido em Paris em 1926 no seio de uma família judaica, converteu-se ao catolicismo. Sacerdote desde 1954, em 1979 foi nomeado arcebispo de Orleans e em 1981, de Paris. Foi eleito cardeal em 1983 e se aposentou em 2005. Era, além disso, membro da Academia Francesa desde 1995. Morreu em Paris em 5 de agosto aos 80 anos. “Seu legado na França e além fronteiras é o de um catolicismo descomplicado, moderno em suas formas – grandes concentrações, canal de televisão confessional, etc. – mas que não fazia concessões nas questões de fundo”, escreve Octavi Martí para o jornal espanhol El País, 07-08-2007. A tradução é do Cepat.

O cardeal, arcebispo de Paris e acadêmico Jean-Marie Lustiger, faleceu em Paris no domingo 5 de agosto em conseqüência de um câncer nos ossos e de pulmão. Nascido em Paris em 12 de setembro de 1926, seus pais, comerciantes, lhe deram o nome de Aarão, em homenagem ao avô polonês, rabino, que havia chegado à França pouco antes da I Guerra Mundial. Aarão foi educado de maneira rigorosa mas laica. A família respeitava as tradições judaicas mas os pais não se consideravam crentes.

A ocupação alemã obrigou a família a se esconder em outra cidade, em Orleans. A mãe continuou a se ocupar com a mercearia que tinham em Paris e, durante uma de suas estadas na capital, foi denunciada por um vizinho. Para ela, isso significou a morte em Auschwitz.

Em 1949, o pequeno Aarão decidiu mudar de religião. Converteu-se ao cristianismo e mudou de nome. A partir de então será Jean-Marie Lustiger. “Sou católico mas também continuo sendo judeu”, dirá anos mais tarde.

Sacerdote desde 1954, Jean-Marie foi enviado à Sorbonne e trabalhou na Universidade até maio de 1968. “A Igreja não tem nada a fazer nessa feira”, sentenciou.

Como pároco de um dos bairros elegantes de Paris entrou em contato com pessoas que serão importantes para o seu futuro. Em 1979, foi nomeado bispo de Orleans e, em 1981, João Paulo II o enviou novamente para Paris, então como arcebispo. O chamado papa Wojtyla confiava em Lustiger e descobriram pontos comuns: origem polonesa, capacidade de comunicação, intransigência dialogante.

Em 1983, foi escolhido cardeal e um ano depois dirigia os protestos multitudinários contra um projeto de lei que pretendia restringir as ajudas públicas às escolas confessionais. Foi uma vitória para ele, pois o ministro Savary se demitiu, a lei não foi promulgada e o presidente Mitterrand descobriu ao mesmo tempo a teimosia e a força de convicção do cardeal. Em 1996, foi ele quem celebrou a missa em Notre Dame, em honra ao presidente socialista morto, com quem teve uma boa amizade.

Em 1996 e 1997, organizou as duas visitas triunfais de João Paulo II à França, a segunda das quais reuniu um milhão de jovens no gramado de um hipódromo vizinho à capital. E ele foi também o inspirador e conselheiro da viagem papal a Jerusalém em 2000; o principal responsável para que os bispos franceses reconhecessem por fim – em 1997 – sua cegueira ou cumplicidade durante a perseguição judaica na França de Pétain, e elemento fundamental na resolução do imbróglio criado por algumas monjas carmelitas polonesas instaladas junto a Auschwitz, o campo de extermínio no qual foi assassinada a mãe de Lustiger e que ele visitou discretamente pela primeira vez em 1983.

Em 1995, foi eleito membro da Academia Francesa. Ali se ocupava da atualização de todos os termos relacionados com a espiritualidade. Há pouco mais de quatro meses, Lustiger participou pela última vez da reunião semanal de acadêmicos e se despediu deles, um por um, comunicando-lhes que não poderia continuar o trabalho do dicionário porque uma doença mortal – um câncer nos ossos e de pulmão – o impediria devido ao tratamento que exigia o alívio da dor.

Jean-Marie Lustiger morreu no dia 05 de agosto na residência hospitalar parisiense em que residia desde 27 de abril. Seu legado na França e além fronteiras é o de um catolicismo descomplicado, moderno em suas formas – grandes concentrações, canal de televisão confessional, etc. – mas que não fazia concessões nas questões de fundo.

Jean-Marie escreveu contra Marx, Freud ou Nietzsche, por terem posto em dúvida a validade da fé como meio de acesso à verdade e porque seu racionalismo desembocou precisamente no genocídio judeu.

Foi solenemente sepultado, no dia 10 de agosto, na Catedral Notre-Dame de Paris. Jean-Luc Marion, filósofo, professor na Universidade de Paris –IV Sorbonne e na Universidade de Chicago, entre outros, publicou o artigo “Lustiger ou l’intelligence de la foi” (Lustiger ou a inteligência da fé) no Le Monde, 12-08-2007.

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