Edição 225 | 25 Junho 2007

Giuseppe Alberigo, historiador do Vaticano II

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Traduzimos e reproduzimos o artigo que segue, de autoria de Hilari Raguer, historiador e monge de Monserrat, publicado no jornal El País, em 21-06-2007 e traduzido pelo Cepat. Ele fala sobre o professor Giuseppe Alberigo, falecido no último dia 15 de junho, na Itália. Sobre Alberigo, confira as Notícias do Dia de 18-06-2007 do sítio do Instituto Humanitas Unisinos e uma entrevista com José Oscar Beozzo, a seguir, após o artigo.

Faleceu, no dia 15 de junho, em Bolonha, Giuseppe Alberigo, que desde o dia 11 de abril estava em coma, vítima de um derrame cerebral. Nascido em 1926, fez parte do grupo de jovens universitários cristãos que formavam uma família espiritual presidida pelo cardeal de Bolonha Giacomo Lercaro . Formou-se como historiador com o grande estudioso do Concílio de Trento, Hubert Jedin. Teve também estreita relação com Giuseppe Dossetti, deputado da ala esquerda da Democracia Cristã, partidário da abertura “alla sinistra” (à esquerda), que deixou a política, foi ordenado sacerdote e seria o conselheiro intelectual e teológico de Lercaro e finalmente se retirou para uma comunidade monástica estritamente contemplativa por ele fundada. Por inspiração de Dossetti, Lercaro fundou o Instituto de Ciências Religiosas de Bolonha, dirigido por Alberigo, com sua revista Cristianesimo nella Storia, para estudar a Igreja com um método rigorosamente histórico, deixando para outros o enfoque teológico ou apologético. Foi professor de História do Cristianismo na Faculdade de Ciências Políticas de Bolonha.

Os dois grandes temas de Alberigo foram João XXIII e o Vaticano II. Propugnou que, superando a mera exegese dos documentos conciliares, se investigasse com rigor histórico o acontecimento conciliar. Com uma ampla equipe internacional (do qual fizeram parte Evangelista Vilanova  e este que assina este artigo), empreendeu uma vasta recopilação de diários e cartas de bispos e teólogos protagonistas do Concílio. Sobre esta base, publicou-se sob sua direção a magna História do Concílio Vaticano II em cinco volumes . Com este método, Alberigo, contra os que limitam o Vaticano II estritamente aos documentos aprovados, defendeu o genuíno espírito conciliar que Paulo VI  sacrificou no altar da unidade, obscurecendo os principais documentos segundo as exigências da minoria conservadora e contra a vontade renovadora majoritária (qualquer semelhança com a transição política espanhola será mera coincidência).

Conheci o professor Alberigo em 1978, num seminário por ele dirigido para a formação de historiadores da Igreja, sobre João XXIII. Sua hipótese de trabalho era que Roncalli não era simplesmente um bonachão simpático e brincalhão, mas pouco preparado, que não sabia o que fazia. No seminário foi abordado o caso do Secretário de Estado Tardini e sua Vila Nazaré, que acolhia órfãos de guerra. Uma aluna, acreditando seguir a corrente do professor, disse que isto era o que muitos curiais faziam: montar algo benéfico para que saísse nos meios de comunicação. Alberigo lhe respondeu: “Não é isto, senhorita. É algo muito pior. Tardini levava muito a sério a Vila Nazaré, dedicava a ela muito tempo e dinheiro e amava como pai aqueles órfãos. Mas, como Secretário de Estado, seguia a política dos Estados Unidos e do Pacto Atlântico, que produzia órfãos de guerra”. Ao contrário, em João XXIII – explicou Alberigo – nunca houve dicotomia entre sua vida pessoal e espiritual e sua atuação como sacerdote, diplomata, bispo ou Papa. As notas que o caracterizavam já desde jovem (origem humilde, distinguir o essencial do secundário, mostrar-se bondoso com todos e obsessivo pela paz), uma vez Papa as transferirá a “seu” Concílio: Igreja dos pobres, suprimir ou mudar coisas secundárias caducas (aggiornamento), um concílio de misericórdia e não de anátemas, uma Igreja não senhora, mas servidora da humanidade e que fomenta a Paz na terra.

Alberigo obteve o título doutor Honnoris Causa por Munique, Estrasburgo e Münster. A Faculdade de Teologia da Catalunha queria conceder-lhe a mesma honra, mas o cardeal Carles, Grão-Chanceler, tendo consultado a Congregação romana responsável pelas Universidades e Seminários, disse que não se daria a necessária aprovação. Alberigo quis averiguar o que havia contra ele em Roma e através de seu amigo, o então cardeal Ratzinger, soube que sua ficha estava suja porque havia participado, anos atrás, de um simpósio sobre os cristãos pelo socialismo, no qual havia defendido uma posição crítica quanto a esta opção.

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