Edição 224 | 20 Junho 2008

“Da V conferência emerge uma Igreja comprometida com a vida humana, de forma integral”

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IHU Online

Geraldo Luiz Borges Hackmann, professor no Departamento de Teologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, concedeu a entrevista que segue, por e-mail, à IHU On-Line, fazendo sua análise do Documento conclusivo da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe – V Celam, realizada em Aparecida no último mês de maio.

Hackmann possui graduação em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, e mestrado e doutorado em Teologia pela Pontificia Università Gregoriana, de Roma. Para ele, a Igreja do continente está vivendo um momento novo, considerando que o documento final “mostra a sensibilidade para com o momento histórico da América Latina e do Caribe”, e “contempla, de forma tranqüila, aspectos antes considerados impossíveis de estarem juntos”. Geraldo Hackmann é autor de vários livros, entre os quais citamos A amada Igreja de Jesus Cristo. Manual de Eclesiologia como comunhão orgânica (Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003) e O que é ecumenismo (Porto Alegre: EST edições, 2007).

IHU On-Line - Quais são as principais características da Igreja que emerge da V Conferência?
Geraldo Hackmann -
Da V conferência, emerge uma Igreja comprometida com a vida humana, de forma integral, e sensível à situação atual. O ponto de partida é a vida, de acordo com a proposta de Jesus Cristo, que quer que todos tenham vida em plenitude (cf. Jo 10,10). Por isso, a defesa da vida, desde o seu nascimento até o seu fim natural. E daí uma Igreja comprometida com a defesa da vida, contra as ameaças que hoje vem sofrendo, como o aborto e outras formas de violência contra a dignidade humana. Isso inclui a promoção integral da dignidade humana, de acordo com a opção preferencial pelos pobres, na perspectiva do amor, pois, como diz o Papa, “a opção preferencial pelos pobres está implícita na fé cristológica naquele Deus que se fez pobre por nós, para enriquecer-nos com a sua pobreza (cf. 2Cor 8,9” (Discurso Inaugural 3). Como o documento reflete a situação atual da Igreja, pode-se afirmar que a Igreja da América Latina e do Caribe está sensibilizada com a situação atual. Os bispos, como pastores que são, conhecem a realidade eclesial e a do continente. 

IHU On-Line – Qual é a importância do jovem para a Igreja hoje, considerando o documento recentemente aprovado pela CNBB e o encontro do Papa com os jovens? Como entender a pouca participação do jovem na Igreja e o que fazer para resgatar esse “rebanho”?
Geraldo Hackmann -
O jovem é muito importante para a Igreja. Seguindo a tradição de João Paulo II, Bento XVI tem se referido diversas vezes à juventude, além de marcar presença no encontro internacional da juventude. No documento final, há um ponto dedicado aos jovens. Depois de enumerar os desafios, o documento cita várias linhas de ação, e, entre elas, renovar de maneira eficaz e realista a opção preferencial pelos jovens, feita em Puebla. A pouca participação dos jovens deve ser entendida dentro de um contexto amplo de desmotivação e descristianização. Os meios de comunicação de massa têm uma grande responsabilidade neste aspecto. As dioceses poderão organizar uma pastoral de juventude mais dinâmica e missionária, para atingir os jovens de forma mais eficaz, inclusive de acordo com as orientações do novo documento da CNBB sobre a juventude.
 
IHU On-Line – Com base em Aparecida, qual é sua opinião sobre as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs)? Necessitamos de outro modelo?
Geraldo Hackmann -
O documento de Aparecida contempla as CEBs. Contudo, reconhece outras formas de movimentos e comunidades eclesiais novas. As CEBs, hoje, continuam tendo um lugar importante na pastoral da Igreja, mas, ao lado de outras iniciativas pastorais. Atualmente, elas não são um modelo exclusivo de pastoral e de vivência comunitária. O capítulo quinto dedica um item às CEBs e pequenas comunidades, dentro do ponto sobre os lugares eclesiais de comunhão. Isto significa que as CEBs, além de serem um sinal de vitalidade na Igreja, são reafirmadas e impulsionadas em Aparecida.
 
IHU On-Line - O tema do impacto do aquecimento global sobre a Terra e sobre a criação mereceu uma atenção adequada da V Conferência?
Geraldo Hackmann -
O tema da ecologia também esteve presente nos debates da Conferência de Aparecida. Prova disto é a presença da Amazônia e da Antártida no documento final, quando, no segundo capítulo, há um item sobre a biodiversidade, a ecologia, a Amazônia  e a Antártida. Também o capítulo nono apresenta um item sobre o cuidado do meio ambiente. A riqueza natural do continente é um dom a ser preservado e, por isso, há uma série de propostas e orientações sobre este tema.
 
IHU On-Line – Qual é a importância da opção pelos pobres e excluídos, que aparece no documento?
Geraldo Hackmann -
A Conferência de Aparecida confirma a opção preferencial pelos pobres, em continuidade com as conferências anteriores. Este desejo do Papa, expresso em seu discurso inaugural, foi acolhido pelos participantes da Conferência. Os discípulos e missionários estão convidados a contemplar os rostos sofridos dos irmãos, pois estes são os rostos sofridos de Jesus Cristo. A Igreja da América Latina quer continuar sendo companheira dos irmãos mais pobres. A prática dependerá de toda a Igreja do continente. Se a Igreja continuar realizando aquilo que vem fazendo nas últimas décadas a favor dos excluídos, estará colocando em prática esta opção preferencial.
 
IHU On-Line - Quais seriam, de maneira sintética, os três grandes pontos positivos de Aparecida e quais as três grandes ressalvas?
Geraldo Hackmann -
É difícil. O tempo dirá quais serão as luzes e as sombras de Aparecida. Nenhuma Conferência é perfeita e não aborda tudo o que deveria. Assim como as outras conferências, Aparecida realizou-se dentro de um contexto concreto e histórico. No momento, poder-se-ão citar alguns aspectos relevantes, como a sensibilidade para com o momento histórico da América Latina e do Caribe que o documento transparece. O equilíbrio do documento, que contempla, de forma tranqüila, aspectos antes considerados impossíveis de estarem juntos. Neste sentido, a Igreja do continente está vivendo um momento novo. A defesa da dignidade humana e a defesa da vida também são aspectos relevantes.

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