Edição 528 | 17 Setembro 2018

Brasil entra em colapso econômico sem o mercado chinês

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João Vitor Santos | Edição: Vitor Necchi

Andrés Malamud aponta que um quarto das exportações brasileiras vai para o país asiático

A China vem se tornando protagonista no cenário mundial porque tem impacto sistêmico e local. “O impacto sistêmico deve-se ao seu peso econômico que define o preço global de várias commodities, e o impacto local, ao seu investimento em diferentes regiões do mundo”, afirma o cientista social Andrés Malamud.

Ao analisar a importância da China na América do Sul, aponta que ela tem um peso superlativo, pois já é primeira parceira comercial de metade dos países. “O padrão de intercâmbio é igual para todos: vendem commodities e importam manufaturas”, detalha em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line. A exceção é o Paraguai, que mantém relações diplomáticas com Taiwan.

Para Malamud, a turbulência política e econômica pela qual o Brasil passa não interfere em nada na relação com a China porque “o governo chinês não se importa com os sistemas políticos dos outros, nem com a corrupção”. O pesquisador considera que o Brasil é um “satélite econômico” da China, pois um quarto das exportações brasileiras vai para o país asiático. “Com uma economia seis vezes maior, e que cresce muito mais rápido, a China tem mínima dependência do Brasil, enquanto o Brasil colapsaria economicamente sem o mercado chinês”, analisa.

Andrés Malamud é pesquisador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. Licenciado em Ciência Política pela Universidade de Buenos Aires, doutor em Ciências Sociais e Políticas pelo Instituto Universitário Europeu de Florença. É pesquisador visitante no Instituto Max Planck de Heidelberg e na Universidade de Maryland, College Park. Leciona em universidades da Argentina, do Brasil, da Espanha, da Itália, do México e de Portugal.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Como tem observado a China no contexto geopolítico atual?
Andrés Malamud – A China tem se erigido como segundo polo de um sistema internacional crescentemente multipolar.

IHU On-Line – E dentro da Europa, como tem sido a recepção ao “avanço chinês”?
Andrés Malamud – Não há uma política unificada da União Europeia. A Alemanha aparece como o maior parceiro comercial, enquanto a China faz incursões (investimento e compra de empresas) na periferia, nomeadamente na Islândia, em Portugal e na Grécia.

IHU On-Line – De que forma a China vem construindo esse protagonismo no cenário mundial?
Andrés Malamud – A China tem impacto sistêmico e local. O impacto sistêmico deve-se ao seu peso econômico que define o preço global de várias commodities, e o impacto local, ao seu investimento em diferentes regiões do mundo.

IHU On-Line – Como é a relação de países da América do Sul com a China? A ligação América do Sul-China é apenas a reconstrução da conexão centro-periferia clássica? Por quê?
Andrés Malamud – Com exceção do Paraguai, que tem relações diplomáticas com Taiwan, a China tem um peso superlativo na América do Sul, onde metade dos países já a tem como primeira parceira comercial. O padrão de intercâmbio é igual para todos: vendem commodities e importam manufaturas.

IHU On-Line – Nesse momento em que a China projeta novas rotas comerciais pela Eurásia, África e inclusive “reeditando” a antiga Rota da Seda, onde se insere a relação com os países latino-americanos, especialmente o Brasil?
Andrés Malamud – Na Belt and Road Initiative - BRI, a América Latina tem um papel menor, e a América Central conta mais do que a América do Sul.

IHU On-Line – O senhor considera o Brasil como “satélite econômico” da China. Gostaria que o senhor detalhasse essa ideia e, a partir dela, refletisse sobre a relação Brasil X China.
Andrés Malamud – Um quarto das exportações brasileiras vai para a China, o que fomentou a reprimarização relativa da sua economia. Com uma economia seis vezes maior, e que cresce muito mais rápido, a China tem mínima dependência do Brasil, enquanto o Brasil colapsaria economicamente sem o mercado chinês.

IHU On-Line – Quais os limites na relação entre Brasil e China hoje? A turbulência política e econômica pela qual o Brasil tem passado pode impactar essa relação? De que forma?
Andrés Malamud – O governo chinês não se importa com os sistemas políticos dos outros, nem com a corrupção.

IHU On-Line – Muitos analistas têm considerado os Brics como um grupo que não tem mais força. Como o senhor observa os Brics hoje? E quais as influências desse grupo para a “ascensão chinesa”?
Andrés Malamud – Os Brics são um foro, não uma organização. Cumprem funções de sinalização e coordenação. Servem a todos os seus membros, embora beneficiem mais aos mais poderosos.

IHU On-Line – O Brasil está inscrito num espectro de relações comerciais com a China, mas se coloca completamente fora de eixo quando a questão é poder e influência geopolítica? Por quê?
Andrés Malamud – Sim. O Brasil não tem recursos para projetar poder fora da sua área.

IHU On-Line – Quais as semelhanças e diferenças entre os regimes socialistas de países da América Latina com o regime chinês?
Andrés Malamud – Não existe semelhança, nem socialismo. O sistema chinês é um capitalismo de estado, enquanto a Venezuela, para dar um exemplo, é um estado colapsado. ■

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