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Mas esconder o sofrimento entre os homens está mudando: “Hoje existe uma valorização do homem sensível, que mostra sua subjetividade, que reflete sobre a própria vida”. Quanto à sexualidade, a maior mudança que se percebe nos últimos anos é “a aproximação entre homens e mulheres. A mulher conquistou o direito de ter prazer, de não se submeter aos desejos masculinos, de buscar suas fontes de realização. Essa é a grande mudança, também, do comportamento masculino”. Graduada em Fonoaudiologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Goldenberg é mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e doutora em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) com a tese Toda Mulher é Meio Leila Diniz: gênero, desvio e carreira artística.
Goldenberg, que leciona no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais do Departamento de Antropologia Cultural da UFRJ, é autora de inúmeros livros e capítulos de livros. De suas obras, destacamos Os Novos Desejos: seis visões sobre mudanças de comportamento de homens e mulheres na cultura brasileira contemporânea. Rio de Janeiro: Record, 2000; Nu&Vestido: dez antropólogos revelam a cultura do corpo carioca. Rio de Janeiro: Record, 2002 e De Perto Ninguém É Normal: estudos sobre corpo, sexualidade, gênero e desvio na cultura brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2004. Escreveu o artigo O discurso sobre o sexo: diferenças de gênero na juventude carioca publicado na coletânea Culturas jovens: novos mapas do afeto. Rio de Janeiro: Zahar, 2006, organizado por Maria Isabel Mendes de Almeida e Fernanda Eugênio.
IHU On-Line - A senhora poderia explicar melhor essa questão do sofrimento masculino e feminino, mencionado em seu artigo O discurso sobre o sexo? Quais seriam suas expressões e quais suas implicações com a vida sexual das pessoas?
Miriam Goldenberg - O que mostro no artigo é que homens e mulheres são socializados diferentemente e mesmo quando os comportamentos efetivos se aproximam, homens e mulheres apresentam discursos diferentes sobre suas vivências. Ainda hoje, homens se sentem obrigados a esconder o sofrimento, a fraqueza, a sensibilidade. Ainda hoje, homens acreditam que devem ter inúmeras parceiras sexuais para serem considerados "homens de verdade". Ainda hoje, homens acreditam que podem ser infiéis e as mulheres não. Assim, em alguns artigos, que podem ser encontrados no meu site (www.miriangoldenberg.com.br) discuto a distância entre os comportamentos efetivos de homens e mulheres das camadas médias cariocas e os diferentes discursos de gênero que eles apresentam, em função de socializações diferentes.
IHU On-Line - O homem continua mantendo seu sofrimento em segredo? Por que isso acontece?
Miriam Goldenberg - Isso está mudando. Hoje existe uma valorização do homem sensível, que mostra sua subjetividade, que reflete sobre a própria vida. Ainda assim, muitos acreditam que devem seguir o modelo tradicional, pois foram socializados dessa maneira: não choram, não falam sobre o sofrimento, têm medo de serem fracos ou sensíveis. Hoje encontramos ainda uma masculinidade hegemônica, mais tradicional, e outras mais alternativas (sensíveis, vaidosos, frágeis etc)
IHU On-Line - Por que a senhora afirma que os homens e as mulheres estão mais próximos que nunca, sobretudo quanto à iniciação sexual e ao número de parceiros?
Miriam Goldenberg - São os dados da minha pesquisa. Como mostro no artigo, os jovens hoje se iniciam praticamente com a mesma idade (16 anos) e têm um número aproximadamente igual de parceiros sexuais. No entanto, os homens tendem a exagerar para cima esse número, e as meninas a diminuir.
IHU On-Line - O objetivo de ter inúmeros parceiros vale para homens e mulheres? Como os gêneros lidam com essa questão?
Miriam Goldenberg - Vale só para os homens. As mulheres querem mostrar uma imagem de controle, em que o sexo é associado ao afeto. Homens dissociam o sexo do afeto, esquecem o número de parceiras que tiveram e gostariam de ter tido muito mais.
IHU On-Line - O que podemos entender por "natureza masculina", expressão que apareceu na pesquisa que a senhora conduziu?
Miriam Goldenberg - Os homens pesquisados apontam uma suposta "natureza masculina poligâmica" para justificar a necessidade de ter muitas parceiras e, também, suas traições. Culpam o instinto, a essência, a natureza masculina pelo desejo sexual, consideram que trairiam a própria natureza se não respeitassem esse instinto. Muitas vezes, amam as esposas mas seguem o instinto para não traírem essa natureza. É um discurso muito presente entre os meus pesquisados. Esse dado também aparece no livro que estou lançando pela editora Record, INFIEL: notas de uma antropóloga. A justificativa para a traição é completamente diferente para homens e mulheres.
IHU On-Line - Em linhas gerais, quais são as maiores modificações que a sexualidade humana vem passando nos últimos anos?
Miriam Goldenberg - Acho que é a aproximação entre homens e mulheres. A mulher conquistou o direito de ter prazer, de não se submeter aos desejos masculinos, de buscar suas fontes de realização. Essa é a grande mudança, também, do comportamento masculino.
IHU On-Line - O que as dificuldades e "faltas" apontadas por homens e mulheres, demonstram sobre seus relacionamentos?
Miriam Goldenberg - Demonstram que as mulheres exigem demais de um parceiro, fantasiam uma relação sem faltas ou imperfeições. Demonstram que os homens demandam muito menos e querem compreensão e paz dentro de um casamento. Como mostro no artigo e no livro Infiel essas diferenças geram conflitos muito difíceis de resolver, o que aparece no número expressivo de separações.