Edição 418 | 13 Mai 2013

Polifonia e reinvenção dos diálogos socráticos

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Márcia Junges e Gabriel Ferreira | Tradução: Gabriel Ferreira

Ao contrário de Trendelenburg, Kierkegaard estava mais preocupado em explorar a existência humana sob as condições da modernidade e para isso valeu-se da “uma nova forma literária”, explica Richard Purkarthofer.

Para o filósofo alemão Richard Purkarthofer, o empreendimento de Kierkegaard em seus escritos pode ser considerado como “uma reinvenção dos diálogos socráticos em sua própria autoria polifônica como diálogos e conversações de seus pseudônimos”. Segundo ele, na entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line, a complexidade da extremamente ambígua obra polifônica desse pensador “desencadeou uma riqueza de diferentes reações”. Outro aspecto destacado por Purkarthofer é a recepção de Trendelenburg por Kierkegaard: o primeiro seria um “sóbrio filósofo”, ao passo que o segundo seria “apaixonado e genioso”. E acentua: “Apesar do apreço de Kierkegaard por Trendelenburg e a despeito das similaridades, eu penso que a razão pela qual Kierkegaard dificilmente aparece no contexto dos filósofos como Brentano, Fischer, Frege e Husserl parece residir no fato de que Trendelenburg tentou elaborar uma visão de mundo orgânica baseada em uma filosofia fundamental que ele chamou de philosophia prima (filosofia primeira). Kierkegaard, por outro lado, não estava interessado nem em ciências naturais, nem em lógica per se. Certamente, Kierkegaard encontrou inspiração nas considerações metodológicas e nos estudos histórico-sistemáticos de Trendelenburg, mas ele estava mais preocupado em explorar a existência humana sob as condições da modernidade e deu a seus achados uma nova forma literária”.

Richard Purkarthofer leciona na Universidade de Wuppertal, na Alemanha. Foi membro da equipe da edição Søren Kierkegaards Skrifter (publicação das obras de Kierkegaard e comentários sobre as mesmas) entre 2006 e 2009 no S. Kierkegaard Research Center, em Copenhaguen. Em 2010 foi fellow na Kierkegaard House Foundation na Hong Library Library (St. Olaf College, Northfield, MN, EUA). Pertenceu ao conselho editorial inicial (2000-08) da nova tradução alemã das obras de Kierkegaard (Deutsche Søren Kierkegaards Edition), de Kierkegaardiana e da série Texts from Golden Age Denmark (editor principal, Jon Stewart). É autor de Kierkegaard (Leipzig: Reclam, 2005) e publicou mais de trinta artigos e capítulos em livros sobre o filósofo, que tratam desde questões filológicas e respectivas implicações no pensamento filosófico, até questões editoriais e consequências das edições de Kierkegaard.

Confira a entrevista.

IHU On-Line - O senhor tem um artigo sobre a recepção de Trendelenburg por Kierkegaard. Como se sabe Trendelenburg e A Questão Lógica foram elementos chave para toda a filosofia alemã posterior (Brentano, Fischer, Frege e Husserl).Não obstante essa relação, a que se deve o fato de que Kierkegaard dificilmente apareça nesse contexto?

Richard Purkarthofer - O filólogo e filósofo Friedrich Adolf Trendelenburg (1802-1872), a quem Kierkegaard se refere repetidas vezes como um pensador sóbrio e profundo é, de fato, uma figura um tanto negligenciada na filosofia do século XIX, ainda que, como você apontou, tenha exercido um impacto impressionante na filosofia pós-hegeliana. Isto se deve, provavelmente, ao fato de que Trendelenburg, diferentemente de Hegel, não inaugurou uma “escola” filosófica, mas conseguiu, através de sua personalidade e ensino, moldar e atrair pensadores independentes e altamente talentosos como seus estudantes. Pode-se mencionar aqui Franz Brentano, Wilhelm Dilthey, Rudolf Eucken, Wilhelm Scherer, Hermann Cohen, Karl Eugen Dühring, Friedrich Paulsen, Friedrich Ueberweg, Ernst Laas, Gustav Teichmüller e Jürgen Bona Meyer. Trendelenburg não apenas escreveu criteriosamente sobre a história de conceitos e da terminologia filosófica, mas inspirou também alguns de seus estudantes a prosseguir com tais estudos (Rudolf Eucken, Carl Prantl e Gustav Teichmüller, por exemplo) estabelecendo assim este tipo de investigação como um campo privilegiado de investigação filosófica.

Trendelenburg colaborou de maneira fundamental para o reavivamento dos estudos aristotélicos no século XIX, desempenhou um importante papel na primeira fase da Fenomenologia (Brentano), bem como na primeira fase do Neokantismo (Jürgen Bona Meyer) e inspirou estudos lógicos (Frege). Além disso, Trendelenburg teve uma influente e importante posição acadêmica por certo tempo, tendo atuado até mesmo como político. Ele foi um filósofo sóbrio e filologicamente treinado. Kierkegaard, entretanto, nunca foi um sóbrio filósofo – ele foi um pensador e um poeta extremamente apaixonado e genioso. É bem difícil imaginá-lo no papel de um político ou em uma poderosa posição acadêmica. Embora tenha lido avidamente os estudos de Trendelenburg sobre a história da terminologia e dos conceitos filosóficos, o uso de certas frases do cotidiano e imagens poéticas é bem mais importante e consistente nos escritos de Kierkegaard do que a terminologia filosófica e teológica tradicional. Os contatos pessoais de Kierkegaard tiveram principalmente uma natureza socrática e não é nem um pouco surpreendente que os copenhaguenses logo tenham desenvolvido com seu concidadão uma atitude similar àquela que os atenienses tiveram para com Sócrates. Provavelmente, Kierkegaard teria sido um professor terrível – estando ciente disso, Kierkegaard nunca levou a cabo o plano de uma série de preleções em 1847.

Controvérsias lógicas

Há também outras diferenças. Enquanto que alguns dos filósofos que você mencionou focaram principalmente na crítica de Trendelenburg à lógica especulativa a fim de desenvolverem um novo tipo de lógica, Kierkegaard estava interessado primeiramente na crítica de Trendelenburg à dialética especulativa no intuito de reintroduzir um tipo de dialética grega, entendida como arte da conversação – mas sob as condições da modernidade. Ademais, o interesse de Trendelenburg é histórico-sistemático: de acordo com ele, filosofia, assim como as outras ciências (Wissenschaften) desenvolvem-se de um modo orgânico. Assim, sua exposição da lógica desenvolve-se sempre com um olhar voltado para suas aplicações nas ciências. Foi exatamente isto o que fez seus trabalhos particularmente interessantes para as gerações posteriores, especialmente para os neokantianos. 

Kierkegaard, entretanto, não está interessado nas Ciências Naturais ou na epistemologia enquanto tal. Não obstante, há muito poucos pensadores aos quais Kierkegaard mostra tanto apreço e reverência quanto por Trendelenburg. Como você mencionou, isto tem a ver com certas controvérsias lógicas que ambos os pensadores tinham com algumas ideias de Hegel. Ambos, Trendelenburg e Kierkegaard, acusam Hegel de borrar a distinção entre as noções de contrário e de contraditório. De acordo com eles, isto permite a Hegel introduzir o movimento na lógica ao contrabandear a intuição para o interior do pensamento supostamente puro. Mas se este assimila um elemento empírico intuitivo para trazer o movimento para o interior da lógica, então este não é mais um movimento imanente e não haveria desenvolvimento necessário de conceitos, uns a partir dos outros, de forma dialética. Isto seria verdadeiro também para a transição ontológica de Hegel do Nada ao Ser. Uma vez que Hegel opera com o tão consagrado princípio de identidade entre pensamento e ser, tanto Trendelenburg e Kierkegaard rejeitam esta ideia: para eles pensamento e ser estão estritamente separados. Segundo eles, esta identidade é encontrada apenas na moção/movimento ou na ação.

Apesar do apreço de Kierkegaard por Trendelenburg e a despeito das similaridades, eu penso que a razão pela qual Kierkegaard dificilmente aparece no contexto dos filósofos que você mencionou parece residir no fato de que Trendelenburg tentou elaborar uma visão de mundo orgânica baseada em uma filosofia fundamental que ele chamou de philosophia prima (filosofia primeira). Tanto Trendelenburg e os filósofos mencionados por você concentram-se nas questões de lógica, epistemologia e ciências naturais. Kierkegaard, por outro lado, não estava interessado nem em ciências naturais, nem em lógica per se. Certamente, Kierkegaard encontrou inspiração nas considerações metodológicas e nos estudos histórico-sistemáticos de Trendelenburg, mas ele estava mais preocupado em explorar a existência humana sob as condições da modernidade e deu a seus achados uma nova forma literária.

IHU On-Line - Quais são as características dessa nova forma literária de filosofia?

Richard Purkarthofer - Se falamos sobre a forma literária da Filosofia, nós temos que ter em mente que a Filosofia provavelmente não começou com os pré-socráticos, mas com Platão. Foi ele quem deu ao caráter “aporético” de uma verdadeira conversação socrática, um formato literário e, ao fazê-lo, ele inventou a forma literária de Filosofia. Assim, Platão moldou a tradição filosófica ocidental desde então e esta tradição chegou, em Hegel, a seu ápice e perfeição – e, dessa forma, também a seu fim. Filosofia neste sentido estava baseada na ideia que ser e pensamento são idênticos e que ela poderia, assim, prosseguir de forma metafísica e conceitual. Hegel, pela última vez na história da Filosofia, tentou descrever a totalidade da realidade a partir de uma perspectiva central usando o Espírito Absoluto como seu princípio e a dialética conceitual não apenas como método de descrição desta realidade, mas também como o método de sua gênese. Conforme mencionei antes, Trendelenburg e Kierkegaard e, na verdade, muitos pensadores de meados do século XIX rejeitaram a ideia da identidade entre pensamento e ser. Para Kierkegaard, então, não era mais possível descrever o todo da realidade a partir de uma perspectiva central. 

Kierkegaard considerava necessário voltar aonde “o caminho se desviou” – o percurso de Platão para o interior do pensamento especulativo desistindo da ideia de “infinito na forma da ignorância” e perseguindo a ideia de conhecimento como reminiscência. Deste modo, poder-se-ia considerar Kierkegaard o novo Platão em relação a Sócrates: dando uma forma literária ao pensamento – na modernidade após o fim da filosofia. A fim de encontrar uma nova forma literária para o pensamento que represente adequadamente a processualidade da cognição em sua forma artística, sua inserção social e cultural que a previne de coerência sistemática e completude lógica e, desse modo, abra espaço a soluções provisórias e seus contraditórios, evite igualmente uma terminologia rígida e adversários atacando-o em seus pontos fracos, Kierkegaard cria sua autoria polifônica. Neste ponto eu devo mencionar que assumo “Søren Kierkegaard”, o presumido autor de vários discursos edificantes, igualmente como um pseudônimo.

Diálogos polifônicos

O que Kierkegaard faz pode ser descrito como uma reinvenção dos diálogos socráticos em sua própria autoria polifônica como diálogos e conversações de seus pseudônimos. Se nós entendemos essa autoria como um trabalho polifônico nos moldes nos quais Mikhail Bakhtin empregou este termo, nenhuma das vozes nestas conversações possui um ponto de vista hermeneuticamente privilegiado que permitiria uma representação literária sistemática de todos os outros a partir de uma perspectiva central. Este procedimento parece-se bastante diverso dos tratados sistemáticos da filosofia tradicional.

IHU On-Line - Como essa forma de discurso filosófico influenciou na recepção do pensamento de Kierkegaard?

Richard Purkarthofer - A complexidade da extremamente ambígua obra polifônica de Kierkegaard desencadeou uma riqueza de diferentes reações. Posso nomear algumas aqui. Um modo de lidar com ela consistiu na desambiguação. Por muito tempo, alguns leitores usaram uma teoria um tanto simplista dos Estádios a fim de enfrentá-la em sua complexidade. Outros usaram a biografia de Kierkegaard para dar sentido à sua obra como um todo. Outras aproximações focaram simplesmente em certos aspectos das obras de Kierkegaard: seu ataque à Igreja, sua defesa poderosa da fé cristã ortodoxa, sua reinterpretação de certas posições teológicas, o acento no indivíduo singular, sua teoria ou crítica social etc. Dentro do âmbito da recepção filosófica a recepção não foi menos diversa. Por outro lado, Kierkegaard tem sido uma inspiração para incontáveis escritores literários que não se importam acerca de suas ideias filosóficas ou teológicas. Sua influência na cultura popular, como em filmes e na música ainda não foi adequadamente explorada. Por mais contraditórias que algumas dessas formas de recepção possam parecer, cada uma delas contribuiu para nosso conhecimento do pensamento de Kierkegaard e do significado de seus escritos.

IHU On-Line - Passados 200 anos do nascimento de Kierkegaard, qual é a importância do seu legado filosófico?

Richard Purkarthofer - Por ser um escritor brilhante, Kierkegaard captura a atenção de leitores de um nível intelectual, filosófico e literário incrivelmente alto. Seus escritos têm um efeito estimulante provocador e desconcertante que não exige leitores entendidos, como ocorre muito frequentemente com textos filosóficos em um sentido mais tradicional. Uma vez que Kierkegaard não parece estar interessado em afirmar proposições verdadeiras ou substituir doutrinas falsas por verdadeiras, mas sim em mudar radicalmente a orientação e a vida de seu leitor, Kierkegaard permaneceu sendo uma figura marginal na filosofia entendida em sentido estrito. Contudo, Kierkegaard cumpre com aquilo que Aristóteles requer da filosofia: representando uma prohairesis tou biou, uma escolha de vida (Metafísica, IV, 2). Ainda assim, os escritos de Kierkegaard têm um contínuo impacto mesmo na filosofia analítica da religião e da ética. Em outros campos do pensamento filosófico, a influência e o legado de Kierkegaard são mais visíveis. Dessa forma, Kierkegaard foi seminal para o desenvolvimento da filosofia do diálogo que encontra suas expressões clássicas em pensadores como Ferdinand Ebner, Martin Buber e Emmanuel Lévinas. Mesmo que estes pensadores consideraram apropriado afastarem-se ou romper com Kierkegaard, sua influência em seus pensamentos é claramente discernível.  Portanto, enquanto este pensamento dialógico for discutido e fornecer inspiração, Kierkegaard continuará sendo discutido também.

Narratologia

Ademais, se nós olharmos para algumas áreas da antropologia filosófica, a influência de Kierkegaard na psicologia, psicanálise e psiquiatria do século 20, que ainda persiste até o presente – assim como persistirá provavelmente no futuro – não deve ser negligenciada. Todos estes campos usam sua terminologia em certos campos de interesse e pesquisa. Isto não é surpreendente uma vez que Kierkegaard analisa e descreve concisamente o self humano. Um self, que está aquém de si mesmo, que é defasado em relação a si mesmo e, portanto, é confrontado com a ansiedade acerca de suas possibilidades inesgotáveis.

Mais recentemente os filósofos começaram a mostrar interesse na narratologia. Esta área de pesquisa surgiu a partir da Folclorística, mas foi assimilada pela linguística, semântica, pelos estudos literários e pela teologia, entre outros. Por um longo período a filosofia foi encarada como um desenvolvimento emancipatório do mythos ao logos. Após o fim da Filosofia no sentido apontado anteriormente, ela parece retornar aos mitos no sentido de narrativas que modelam não apenas nossa cognição, mas também nossas vidas, identidade e autocompreensão. Nós podemos esperar que o estudo dessas histórias pelas quais vivemos possa ser enriquecido pelos pensamentos de Kierkegaard. Isto nós podemos recolher a partir do seu uso frequente de histórias e contos de fadas, bem como da sensibilidade de Kierkegaard para com eles e de suas recorrentes descrições da condição humana em termos gramaticais e narrativos.

Conversações interculturais

Muitos outros aspectos do legado de Kierkegaard podem ser mencionados, mas eu restringirei minhas observações a mais duas questões. Nas décadas recentes, Kierkegaard ganhou cada vez mais importância no debate global, que deixou restrições provinciais e etnocêntricas para trás e abriu-se para uma Filosofia Mundial. Dado o crescente impacto da globalização, outras formas de pensamento e espiritualidade, outras experiências e experimentos acerca do que significa ser um ser humano não podem mais ser ignorados. A forte ênfase de Kierkegaard na existência humana vai além dos estreitos limites e restrições denominacionais e culturais e desse modo torna-o um profundo aliado nas conversações interculturais. É um fato bastante conhecido que o interesse acadêmico depende principalmente dos recursos financeiros disponíveis. No entanto, neste caso, não é apenas uma questão de leitores entendidos. O interesse em Kierkegaard, bem como as traduções de seus escritos não apenas para línguas e países mencionados antes, mas também no sul e no leste da Ásia, Austrália e nas Américas indicam que Kierkegaard ainda – e mesmo de maneira crescente – está atingindo pessoas independentemente de suas bagagens sociais, culturais, filosóficas, religiosas e espirituais.

Por fim, eu gostaria de mencionar a questão de um possível fim do interesse nos pensamentos de Kierkegaard. Na modernidade tardia nós temos de encarar a possibilidade da extinção dos seres humanos como nós os conhecemos. Tão logo seres humanos não tenham mais a possibilidade de falharem em serem si mesmos, a humanidade como nós a conhecemos chegará ao fim. Neste ponto, os escritos de Kierkegaard estarão ultrapassados.

IHU On-Line - Qual é a sua avaliação sobre a recepção da obra de Kierkegaard na Alemanha?

Richard Purkarthofer - As traduções alemãs de algumas das obras de Kierkegaard, bem como os estudos acadêmicos germanófonos desempenharam um papel fundamental na transmissão de seu pensamento para os leitores anglófonos e francófonos na fase inicial de recepção. Curiosamente, estas obras desempenharam um importante papel no processo de aproximar Kierkegaard dos estudos acadêmicos dinamarqueses. Exagerando um pouco podemos lembrar, neste contexto, da importância dos filmes de Walt Disney em trazer as histórias de Hans Christian Andersen para a Dinamarca. Além disso, mesmo até recentemente, os leitores húngaros, búlgaros e mesmo os italianos, portugueses e espanhóis travaram contato com Kierkegaard através de traduções alemãs ou traduções que foram baseadas nestas e nos estudos germanófonos. Felizmente, isto está atualmente mudando de maneira rápida e mais e mais traduções são feitas baseadas diretamente nos textos originais. Além disso, o lugar pioneiro das traduções alemãs para a transmissão do pensamento de Kierkegaard pode ser aferido pelo fato de que um dos textos de Kierkegaard, a saber, as notas das Preleções de Schelling em Berlim, foi traduzido para o alemão mesmo antes de ser publicado na Dinamarca.

Indivíduo singular

Quando se trata da recepção da obra de Kierkegaard na Alemanha, nota-se que a recepção ocorrida no século XIX foi centrada em tópicos teológicos, atingindo tão somente um restrito círculo composto em sua maioria por teólogos. Um maior círculo de leitores foi alcançado na literatura de fin-de-siècle de Viena, a qual encontrou em Kierkegaard uma representação altamente estética de sua própria luta com o esteticismo. Aproximadamente ao mesmo tempo a obra de Kierkegaard causou impacto em alguns dos primeiros representantes da filosofia do diálogo que nós mencionamos anteriormente. Pouco depois, da segunda década do século XX em diante, representantes da teologia dialética, como Barth, Bultmann e Brunner interessaram-se pela teologia de Kierkegaard. A influência de Kierkegaard sobre Heidegger, especialmente em sua obra magistral Ser e Tempo, é amplamente conhecida, embora pouco explorada. Heidegger e Jaspers foram essenciais para que Kierkegaard fosse – correta ou incorretamente – associado ao movimento existencial. Daí em diante seria mais adequado não falar de uma recepção especificamente alemã ou germanófona, dada a internacionalização dos estudos sobre Kierkegaard.

Devido a estas formas altamente variadas de recepção não apenas no mundo germanófono – e poder-se-ia dizer mesmo a despeito disso – os escritos de Kierkegaard encontraram frequentemente o leitor pelo qual eles ansiavam: o indivíduo singular.

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