Edição 362 | 23 Mai 2011

Um emaranhado pelo Rio Grande a fora

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Ana Maria Rosa

Olhar a terra que se estende além da vista nos pagos do nosso estado nos coloca questões interessantes: como entender, nessa vastidão, que um instrumento de comunicação pode dar conta de, pelo menos, distribuir a informação de forma igualitária?

Não pode. Nem um instrumento, nem um canal, nem um indivíduo. O único nunca substitui o coletivo, e muito menos nele penetra de forma consistente. A comunicação em nível macro, seja nos grupos sociais, nas empresas, nas cidades, nos estados, nos países ou no mundo, só funciona em rede.

E isso não é novidade, afinal, tantos estudos já apresentam resultados precisos sobre a força da comunicação boca a boca, dos núcleos reunidos por internet ou das rodas de chimarrão. Não é o digital que nos transforma em sociedade em rede, mas, de certa forma, é a partir dele que podemos nos reconhecer mais fortemente como tal.

Não é à toa que redes de cooperação são cada vez mais fortes, unindo-se por ideais e dividindo-se em ações particularizadas. Assim são as grandes organizações protetoras do meio ambiente, e também o são as redes terroristas, como a tão comentada Al-Qaeda, de Osama bin Laden. Enquanto muitos buscam por um líder, outros enxergam no plural uma forma de somar esforços e dividir problemas, rompendo barreiras a partir do senso de coletivismo, muitas vezes transformando a realidade mais profundamente do que um mero conteúdo que ganhou destaque nos jornais do mundo todo.
Mas gostaria de enxergar mais além: a comunicação em rede não apenas distribui a informação, mas também nivela. Por nivelar a informação quero dizer que, estrategicamente, permite todos poderem, de alguma forma, compreender o que se está dizendo. A rede não é apenas o canal, mas é também o ajustador necessário para que o conteúdo alcance, em todos os sentidos, os diversos públicos que por ela se distribuem.
Acredito na importância de cada vez mais entendermos que o tal conteúdo em rede sempre existiu, e que é por conta dele que nós, homens, podemos dar passos enquanto sociedade complexa. Nem sempre as escolhas são as melhores, mas são sempre resultado de um coletivo – apático ou não.

Quando revemos processos como o questionamento de por que algumas sociedades elegem e mantém como seus representantes exemplares humanos que nos parecem aberrações – com distúrbios psicológicos, éticos e de socialização – sempre teremos como afirmação final que esta mesma sociedade tem responsabilidade nessa escolha, não tendo sido enganada ou inocente nesse investimento. E isso simplesmente porque nos pequenos níveis de relação entre seus membros, valores distorcidos acabaram por levar ao nível extremo, a chefia do Estado, por exemplo, essa realidade.
Dizer isso não é dizer, no entanto, que o consenso esteja instalado e que todos que estão aglutinados no que chamamos de nação respondem da mesma forma pelo poder que os reúne. De qualquer forma, a realidade posta é resultante de um processo que permeia os conceitos de “gregos e troianos” – nem mesmo os polos deixam de ser um elemento que leva ao desfecho, sendo eles também reforçadores desse final.
De fato, então, se nossa sociedade não se aprofunda em determinados temas, é porque, de alguma forma, esses temas não tomaram conta da necessidade coletiva de nosso povo.
É certo que há influências, ou pontos focais da rede, que contribuem para que determinados assuntos tenham destaque em detrimento de outros. Mesmo assim, a rede não está apagada; não são apenas os assuntos emanados por pontos focais que podem ganhar destaque, mas qualquer pequeno ponto pode ganhar no jogo das atenções quando a fluidez do coletivo assim o permitir.
Enquanto pequenas ONGs já lutavam por incorporar valores como a cooperação, o não racismo, a indiferenciação entre gêneros e credos há muitas décadas, somente nos anos recentes – talvez nesses cinco últimos – é que pudemos realmente apreciar as modificações que os bons valores vêm causando na nossa sociedade. Ainda de forma tênue e pouco impactante. Mas ninguém mais pode dizer que nunca ouviu falar em ecologia ou em solidariedade.

Investir, então, em uma comunicação solidária é realmente investir no que interessa. Enquanto a comunicação popular buscar a mera similaridade com mídias que já são quase transparentes por terem se tornado entretenimento, não haverá nela a força e a destreza necessárias para que as mentes sejam tomadas de pouco a pouco pelas mudanças benéficas à sociedade.
Valores bons ou maus são muito difíceis de serem reconhecidos, mas o coletivismo e cooperação estão entre os valores que nivelam os graus de separação que empobrecem as sociedades – e dessa forma nos auxiliam no movimento importante de transcendência dos valores materiais e supérfluos que estão iminentes no mundo atual.

Assim, atribuo ao formato em rede uma grande oportunidade para a compreensão dessa fluidez e dessas diversas tendências que temos, nós, os humanos. Entendendo que a vida quer viver, e que as perspectivas confluem para nos entregar os melhores caminhos, encerro dizendo que estamos em busca de novos valores, mas nem todos serão tomados pelo coletivo – e esses secarão a margem da estrada.

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