Edição 357 | 11 Abril 2011

A ecologia das mudanças tecnológicas

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Por Anelise Zanoni | Tradução Benno Dischinger

A ecologia das mudanças tecnológicasAo analisar a ideia de McLuhan de que os meios são prolongações do corpo humano, o sociólogo Octavio Islas afirma que as redes sociais são prolongamentos de veias e artérias do ser

Para compreendermos os meios, é necessário percebê-los como ambientes de interação e transformação. Assim, surge a discussão acerca da ecologia dos meios, assunto debatido pelo sociólogo mexicano Octavio Islas em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line.

“Essa ecologia dos meios analisa como os veículos de comunicação afetam a percepção humana”, diz o pesquisador, que se debruça nas obras de Marshall McLuhan para explicar os fenômenos comunicacionais.
“No caso de ambientes midiáticos (como livros, rádio, cine e televisão) as especificações são geralmente implícitas e informais, ou parcialmente ocultas, pela razão de não estarmos lidando com um ambiente, senão simplesmente com uma máquina”, lembra o entrevistado citando o teórico Neil Postman.  Em sua opinião, “a ecologia midiática pretende tornar explícitas essas especificações, tratando de encontrar quais papéis os meios nos forçam a desempenhar, como os meios estruturam o que estamos vendo e por que razão eles nos fazem sentir e atuar do modo como o fazemos”. Diante do ambiente midiático, outras revelações surgem, como o papel das redes sociais, que podem ser consideradas prolongamentos de nossas veias e artérias na conformação do ser social.

Sociólogo, o mexicano Octavio Islas é mestre em Comunicação e Desenvolvimento e doutor em Ciências Sociais. Atua como diretor do Projeto Internet-Cátedra de Comunicação Estratégica e Cibercultura do Centro Tecnológico de Monterey, no México. Também é membro da Academia Mexicana de Comunicação e autor de oito livros.

Confira a entrevista.


IHU On-Line – Tendo em vista o avanço da tecnologia e das relações humanas, podemos dizer que temos hoje a mesma compreensão sobre a célebre expressão de McLuhan “o meio é a mensagem”?

Octavio Islas –
Sem dúvida, trata-se da citação mais utilizada de Marshall McLuhan. Pesquisador da comunicação, ele fazia a distinção entre mídia (meios de comunicação) e médium, que é qualquer coisa que estende nossa mente, nosso corpo ou nossos sentidos. Hoje, podemos considerar uma nova tecnologia ou um gadget (aparelho). McLuhan ofereceu abundantes exemplos sobre sua tese: a roupa, por exemplo, é extensão da pele, a motocicleta é extensão da bicicleta, que por sua vez estende nossas pernas. O meio é a mensagem, porque o conteúdo de todo novo meio são os meios anteriores. Isso ainda não mudou.


IHU On-Line - Para os estudiosos da comunicação, o conjunto de dispositivos técnicos sofisticados e complexos pode criar uma dificuldade metodológica que se refere ao pensar. Como o senhor avalia essa mudança?

Octavio Islas -
Um dos principais objetos de estudo da ecologia dos meios é a fenomenologia das mudanças tecnológicas. Essa área, chamada de “Media Ecology” é uma escola do pensamento científico que tem se destacado por conceder particular ênfase ao estudo do impacto cultural das tecnologias e dos meios de comunicação nas sociedades, por meio da história. As teses de Marshall McLuhan representam seu principal fundamento teórico e epistemológico. Entre os principais teóricos destacam-se: Harold Innis,  Walter Ong,  Neil Postman, Jacques Ellul,  Elizabeth Eisenstein,  Eric Havelock,  entre outros. Neil Postman definiu que essa ecologia dos meios analisa como os meios de comunicação afetam a percepção humana, a compreensão, a sensação e o valor; e como nossa interação com os meios facilita ou impede nossas possibilidades de sobrevivência. A palavra ecologia implica o estudo do ambiente: sua estrutura, conteúdo e impacto sobre o povo. Para ele um ambiente é, enfim, um complexo sistema de mensagens que impõe ao ser humano certas formas de pensar, sentir e atuar. Ele estrutura o que podemos ver e dizer e, por conseguinte, sentir e atuar. Assinala papéis e insiste no exercício dos mesmos. Especifica o que nos é permitido fazer ou deixar de fazer. Em certas ocasiões, como é o caso de um tribunal, uma sala de aulas, ou um escritório, as especificações são explícitas e formais. No caso de ambientes midiáticos (como livros, rádio, cine e televisão) as especificações são geralmente implícitas e informais, ou parcialmente ocultas, pela razão de não estarmos lidando com um ambiente, senão simplesmente com uma máquina. A ecologia midiática pretende tornar explícitas essas especificações, tratando de encontrar que papéis os meios nos forçam a desempenhar, como os meios estruturam o que estamos vendo e por que razão eles nos fazem sentir e atuar do modo como o fazemos. A Ecologia dos Meios é o estudo dos meios como ambientes.

A “Media Ecology” também é conhecida como Escola de Toronto, Escola de ova York, Mediologia, Escola de São Luís ou Escola Norte-americana da Comunicação. Na Ecologia dos Meios a “fatalidade” das mudanças tecnológicas admite ser compreendida como princípio “ecológico”. Os meios e as tecnologias, afirmou McLuhan, são extensões do homem e aceleradores da vida sensorial: “qualquer meio afeta em seguida o campo inteiro dos sentidos”, disse o pesquisador.


IHU On-Line - Como os estudos de Marshall McLuhan podem ser utilizados por professores de Comunicação nas salas de aula?

Octavio Islas -
Não há nada mais prático do que uma boa teoria, e não são poucos os principais promotores de desenvolvimento da internet que têm destacado a utilidade e pertinência das teses de McLuhan. O pesquisador canadense deve ser reconhecido como ponto de partida obrigatório no estudo das comunicações digitais.


IHU On-Line - Como o senhor avalia o determinismo tecnológico de algumas obras de McLuhan?

Octavio Islas -
O termo determinismo tecnológico foi proposto por pessoas que ignoram a existência da Ecologia dos Meios e foi adotado por detratores de McLuhan na América Latina, pessoas que o consideram funcionalista. Eles acreditam que o pesquisador nasceu nos Estados Unidos, mas, na realidade, McLuhan era canadense.
O próprio McLuhan, mas principalmente Neil Postman, deve ser considerado como um dos principais críticos do determinismo tecnológico. Postman trabalhou particularmente com a televisão.


IHU On-Line - Como pode hoje ser feita uma análise da relação entre o homem e a tecnologia da informação?

Octavio Islas –
Atualmente temos muitos estudos sobre o assunto, desde a perspectiva da ecologia dos meios. Lance Strate,  por exemplo, é autor de uma interessante pesquisa sobre o emprego do telefone celular no trânsito, enquanto as pessoas conduzem um automóvel. Ele partiu da consideração de que o celular é um meio frio, de baixa definição, que necessita ser complementado – e por isso simplesmente distrai os condutores ou motoristas. A cada ano se apresentam estudos realizados desde a perspectiva da Ecologia dos Meios numa convenção anual, e o tema segue em debate. Por cumprir-se, neste ano, o 100º aniversário natalício de McLuhan, a convenção realizar-se-á no mês de julho, em Alberta, Canadá, onde serão discutidos assuntos cada vez mais atuais.


IHU On-Line - Redes sociais, como Twitter e Facebook, já podem ser consideradas extensões do homem?

Octavio Islas -
Primeiro devemos reconhecer os ambientes midiáticos resultantes do desenvolvimento da Internet 2.0 – a blogosfera e a twittosfera -, por exemplo. As redes sociais, entretanto, admitem ser consideradas como prolongações de nossas veias e artérias na conformação do ser social, e estendem e multiplicam as possibilidades de sociabilidade nas pessoas.

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