Edição 357 | 11 Abril 2011

As interfaces do meio e mensagem

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Anelise Zanoni

Para a jornalista Filomena Bomfim, o excesso de informações das mídias permite o aprofundamento e a compreensão melhor da realidade

Analisando a versão da máxima de McLuhan em que o “meio é a mensagem”, a jornalista Filomena Bomfim acredita que, se considerarmos os limites físicos de cada mídia, os meios de comunicação podem hoje transferir o mesmo fato de maneira distinta. O significado contemporâneo é que, para cada meio, há uma mensagem diferente.

O que parece simplista no processo de comunicação é muito mais profundo, como revela Filomena em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line. Para ela, se compararmos os efeitos narrados nas obras do autor com os resultados da revolução tecnológica que vivemos, pode-se afirmar que McLuhan se aproxima da realidade atual. Diante de tantas informações, o público é cada vez mais exigente e crítico e “as diversas abordagens possibilitadas pela natureza diferente das mídias têm permitido o aprofundamento da compreensão da realidade, por meio do cruzamento de informações e do acesso a uma variedade considerável de fontes”.

Graduada pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Filomena Bomfim é doutora em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e pós-doutora pelo McLuhan Program in Culture and Technology – MPCT, na Universidade de Toronto, no Canadá. Professora da Universidade Federal de São João Del-Rei, atua na área de jornalismo e novas tecnologias e especializou-se no desenvolvimento de metodologias de pesquisas para análise das novas mídias.

Confira a entrevista.



IHU On-Line - A quantidade de informações obriga o público a selecionar e a pesquisar outros veículos para que não fique perdido. Como você analisa a situação, tendo como referência a ideia de McLuhan na qual a tecnologia influencia no comportamento do homem?

Filomena Bomfim -
Quando o público pesquisa a mesma informação em vários meios de comunicação, entendo que ele está vivenciando a possibilidade de se valer da complementariedade das mídias para se aproximar cada vez mais do acontecimento, por meio da comparação entre as diversas manifestações noticiosas exibidas em mídias diferentes. Marshall McLuhan acreditava que a natureza singular de cada meio podia apresentar o mesmo fato de maneira distinta. Assim sendo, entendo que, analisando o cenário tecnológico atual, as diversas abordagens possibilitadas pela natureza diferente das mídias têm permitido o aprofundamento da compreensão da realidade, por meio do cruzamento de informações e do acesso a uma variedade considerável de fontes. Portanto, percebo que os públicos têm se tornado cada vez mais exigentes e críticos, tendo em vista a possibilidade de pesquisar questões de seu interesse ampla e exaustivamente, valendo-se da sofisticação tecnológica.

Além disso, o mesmo fato pode ser percebido de forma diferente em diferentes contextos. Então, somada à sofisticação tecnológica, a possibilidade de verificar pela internet a avaliação de situações em diferentes cenários, pode enriquecer ainda mais as possibilidades de leitura de um mesmo fato.


IHU On-Line - De que forma o meio é mensagem hoje?

Filomena Bomfim -
Cada meio de comunicação pode transmitir um mesmo fato de maneira distinta, se se considerar os limites físicos de cada mídia. Assim sendo, a televisão vai privilegiar a imagem, enquanto o rádio pode exibir recursos sonoros que vão agregar valor à mesma situação mostrada pela TV. O jornal e a revista, por sua vez, podem adicionar abordagens retrospectivas analíticas à notícia. A internet pode se valer da convergência hipermidiática para apresentar o mesmo fato, utilizando-se plataformas multimodais díspares para estimular ainda mais os sentidos humanos por meio de sons, cheiros, imagens, animações, que se refiram ao fato em questão.


IHU On-Line - As seções de tempo real abrem espaço para um novo conceito de jornalismo? Qual seria ele?

Filomena Bomfim -
A questão do tempo real. Harold Innis,  que influenciou definitivamente a obra de McLuhan, afirmava em seu livro Changing the concepts of time (Rowman & Littlefield Publishers, 2004, 160 p.) que o futuro presenciaria meios de comunicação que desafiariam os conceitos ortodoxos relativos ao tempo. Considerações desse tipo, com certeza, contribuíram para que McLuhan ratificasse posturas visionárias que o intrigavam profundamente enquanto pesquisador das novas mídias. Além disso, James Joyce  (autor do romance Finnegans' Wake, cuja estrutura baseada em flashbacks inaugurou um novo estilo de narrativa) também contribuiu para a complexificação desse quadro ao influenciar o teor crítico da obra de McLuhan com relação à linearidade das mídias tradicionais, em contraposição à multilinearidade das novas tecnologias que podiam permitir uma considerável diversidade de leituras.


IHU On-Line - Como você analisa o modo de pensar gerado pela cultura tecnológica e o produzido pela da cultura da imprensa?

Filomena Bomfim -
Entendo que as novas tecnologias propiciam o convívio de múltiplas abordagens sobre o mesmo tema, a partir da possibilidade de explorar a busca motivada pelo interesse do internauta, que é intuitiva, não sequencial, assistemática e pouco racional, mas, com certeza, muito mais próxima do prazer.


IHU On-Line - É possível acreditar em um domínio das máquinas sobre os humanos?

Filomena Bomfim -
Não acredito no domínio das máquinas sobre os humanos. Percebo, todavia, que a sofisticação tecnológica tende a dificultar o acesso às questões mais essenciais para a realização humana.


IHU On-Line – Em sua opinião, como McLuhan ajudou a contribuir para o pensamento sobre o desenvolvimento da tecnologia?

Filomena Bomfim -
Estimulando principalmente as discussões sobre o público e o privado, além dos debates sobre os limites entre essas duas instâncias, a partir da sofisticação tecnológica. Causava-lhe espanto a possibilidade de se pensar o fim da propriedade privada dos bens simbólicos, dos direitos autorais, entre outras questões. McLuhan sentia-se instigado por tais possibilidades e gostava de discuti-las.


IHU On-Line - McLuhan acreditava que as mídias eletrônicas reduziriam o mundo a uma tribo ou a um vilarejo em que tudo ocorre no mesmo momento. Como você avalia a ideia do autor, tendo como comparativo a disseminação de redes sociais cada vez mais pontentes?

Filomena Bomfim -
Marshall McLuhan acreditava que os meios de comunicação poderiam transformar o mundo em uma aldeia global, cuja característica mais marcante era a falta de privacidade humana, provocada pela excessiva exibição dos vários planos da existência do homem. Observando a potência das redes sociais, percebo que ele se aproximou bastante da realidade vivenciada por nós, na medida em que as redes sociais ameaçam particularmente a questão da privacidade do indivíduo que faz parte delas, colocando em circulação no ciberespaço questões pessoais que podem ameaçar até a segurança dos indivíduos.

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