Edição 355 | 28 Março 2011

Cláudio Mandarino

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Anelise Zanoni

Apaixonado por esportes desde a infância, o professor Cláudio Mandarino, da Faculdade de Educação Física da Unisinos, relembra a vida de criança em um conjunto habitacional para refletir sobre a própria carreira. O menino serelepe de Uruguaiana que gostava de correr pelo condomínio dedica-se hoje à docência e a compreender o universo infantil e as práticas esportivas. A partir da observação, reconhece os próprios desafios em interpretar a realidade das crianças e afirma que “é preciso acompanhar o universo que é oferecido aos pequenos”. Na entrevista, o professor revela seu interesse por viagens e pelo conhecimento e conta como introduziu a ousada ideia de ler poesias nas aulas de Educação Física. Para explicar, diz que é necessário experimentar o novo e saber usar diferentes potencialidades para que cada estudante melhore a própria formação. Confira a entrevista.

Origens

Nasci em Uruguaiana, cidade natal de toda minha família. Tenho dois irmãos, um mais velho e outro, mais novo. Minha mãe era professora de séries iniciais e meu pai, agricultor. Na infância, morávamos em um apartamento do BNH e ali tivemos experiências típicas de criança. Tudo ocorria no condomínio e nos arredores, o que me fazia bem articulado com as brincadeiras.
Meus irmãos fizeram Medicina, em Caxias do Sul, e Agronomia, em Uruguaiana. Eu optei por estudar em Porto Alegre. Cheguei à Capital em 1984, para fazer curso de Educação Física na Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Durante a graduação, participei de eventos estudantis e ganhei motivação para atuar na Educação Física escolar. Minha formatura ocorreu em 1988.

Estudos

Sempre tive muito envolvimento com as práticas esportivas. No terceiro ano do ensino médio pratiquei karatê e percebi que gostava muito de esportes. Quando escolhi Educação Física como graduação, meus pais já imaginavam, porque eu me identificava com a área. Ao me formar, sabia que queria atuar na área educacional.

Minha primeira experiência como professor foi em escolas infantis. Fiz estágios em educação infantil. Posteriormente, passei em um concurso do município de Gravataí, em 1993, e comecei a trabalhar com alunos de séries iniciais.

No período da Educação Física escolar, participei de reuniões pedagógicas e, a partir de reuniões com colegas, comecei a me interessar por assuntos debatidos em grupos de estudos, até que fui inserido em uma das pesquisas.

Em 1990, já tinha feito especialização em Educação Psicomotora e, entre 1994 e 1995, fiz especialização em Metodologia do Ensino e Educação Física para Deficientes. Com o olhar acadêmico sobre as práticas do cotidiano aprendi a ter uma nova perspectiva para a carreira. Comecei a pensar na formação posterior, que veio em 1998. Na época, escolhi novamente a escola da UFRGS e fazia parte do conselho de alunos.
A experiência me ajudou a pensar em uma educação com mais qualidade. Buscava vias através das quais isso pudesse acontecer, em que o profissional fosse mais valorizado e pudéssemos fazer discussões pedagógicas. Também participei como coordenador do Centro Estadual de Treinamento Esportivo - Cete, em Porto Alegre. Desde 2002, sou professor de uma escola municipal de Porto Alegre.


Aprendendo com as crianças

Logo que concluímos uma graduação temos questões importantes, como saber aplicar o que aprendemos na faculdade e se isso se adequará à realidade. Quando me formei, tinha a sensação de que não tinha contato com crianças há muito tempo. Tinha vontade de trabalhar na área da Educação, mas não sabia como seria.

Aos poucos, fui descobrindo os interesses delas e como trabalhar com elas. Na época, as Tartarugas Ninja eram sucesso, e eu observava a atitude dos pequenos, precisava saber o que estava ocorrendo na vida deles. Hoje em dia, olhamos as crianças como sujeitos consumidores. As empresas deram uma guinada, porque levaram o universo infantil para o mercado, o que faz com que programas não sejam educativos. Vende-se um mundo infantil em que os pais são envolvidos. Esses heróis que aparecem são incorporados por crianças nas brincadeiras da Educação Física. Comecei a compreender isso e encontrei desafios, os quais foram me ajudando a interpretar a realidade. Precisamos acompanhar o universo que é oferecido aos pequenos.


Pequenos especiais

Quando fiz a especialização em Educação Psicomotora pensei em fazer uma intervenção mais qualificada, relacionando coordenação motora ampla, organização espacial e temporal. Ao mesmo tempo, percebo que há demanda para crianças com problemas de desenvolvimento. Quando sou chamado para as escolas públicas, já procuro a escola especial para viver este desafio.
A experiência mostra o quanto essas crianças têm potencialidades. Ficar “patologizando” não dá. Eles têm histórias como outras crianças, mas têm situações em que precisam de atenção, porque não são completamente aprendentes ou ouvintes. Às vezes, podem não ter a visão, são usuários de cadeira de rodas. Às vezes, o professor passa a olhar apenas a deficiência, e não a criança como um ser com potencialidades.
Esse deslocamento fez com que eu não olhasse apenas para as patologias, mas para as motivações, a vontade de aprender coisas. Encontrei novos desafios e começamos a perceber novas potencialidades, sem esquecer a individualidade de cada criança.


Família

Sou casado há 18 anos com a arquiteta Silvia Pereira Mandarino, que também atua na área da Educação. Temos experiências diferentes, porque ela trabalha com a profissionalização de jovens. Está focada na construção de maquetes, plantas baixas, e normas de construção.


Lazer

Gostamos muito de viajar. Nos dois últimos anos fizemos duas viagens legais. Ano passado fomos a Santiago do Chile e, no último verão, estivemos 11 dias no Peru. Passamos por Lima, Cusco e Puno. Procuramos sempre extrair algo importante das viagens. Também gostamos de cinema, teatro e passeios curtos, leitura. Pratico semanalmente karatê e voltei a treinar há cinco anos.

Experiências importantes

O ato de ensinar e aprender é a grande experiência que tenho e que tive. Estar diante dos estudantes me desafia para a realidade. Gosto de trabalhar com a Educação, na universidade e na escolas públicas de Porto alegre.

Unisinos

Comecei na universidade em 2000, com a disciplina Movimento Humano e Necessidades Educativas Especiais, que tratava de diferenças de pessoas com deficiências e necessidades. Cegos, surdos, deficientes mentais e físicos estavam no foco. Com a vida pedagógica começo a explorar cada vez mais a relação com as patologias.

Hoje a disciplina tem o nome de Estratégias de Ensino e Inclusão, que junta inclusão e diferença e estratégias de ensino. Não tem foco somente sobre alunos com necessidades, porque faço discussão sobre as diferenças. Começo a ver também questões pedagógicas provenientes de experiências do ano passado e incremento a vontade pelo saber. Passei a introduzir pelo menos uma poesia em sala de aula. Também criei outros espaços, organizei dois saraus de poesia no bar da Educação Física e estamos nos preparando para a terceira edição.

A ideia é que outros estudantes também experimentem. É um convite para a formação. Gosto de experimentar estratégias pedagógicas, e o retorno é bastante bom. Assim, usamos outras potencialidades e nos testamos.

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