Edição 263 | 24 Junho 2008

Perfil Popular - Gerson Antonio da Silva

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Patricia Fachin

Gerson Antonio da Silva, 62 anos, é um dos moradores mais antigos da Vila Brás. Integrante da Associação de Moradores, ele acompanhou de perto as evoluções da região e foi um dos responsáveis pela mobilização popular da comunidade. Em conversa com a equipe da IHU On-Line, Gerson Baiano, como é conhecido no bairro, conta sua história de vida e fala sobre a militância política, seguida desde os 16 anos.

Descendente de italianos, Gerson nasceu no município de São Francisco de Paula, na serra gaúcha. Filho de comerciante, ele teve uma infância tranqüila e, mesmo com todas as dificuldades da vida interiorana, conseguiu estudar. “Apesar de morar na colônia, eu nunca trabalhei. Durante o segundo grau, estudei em um colégio de padres, onde fiquei interno. O colégio era muito rígido. Os padres não deixam os alunos se organizarem em grupos para fazer mobilizações, mas eu sempre participava de movimentos que reivindicavam melhoras”, lembra. Desde jovem, Gerson Baiano era contestador e, quando vivia com a família, protestava em prol dos empregados, provocando discussões ferrenhas com seu pai. “Meu pai era comerciante e sempre foi de direita. Eu e meu irmão não concordávamos com as barbaridades que ocorriam no interior. Os latifundiários contratavam ‘uns coitados’ e pagavam seus serviços com um pouco de comida. Eu sempre achei isso um absurdo.”

Com 16 anos, quase concluindo o segundo grau, ele decidiu abandonar os estudos e seguir na militância política, lutando em favor dos menos favorecidos. Nessa época, em plena Ditadura Militar, participou do Grupo dos 11, fundado por Brizola. “ Os militantes não queriam me deixar participar, porque eu era menor de idade, mas insisti até convencê-los. Foi nesse período que ganhei o apelido de Baiano”, conta. Perseguido pelos militares, dos 17 aos 23 anos ele precisou mudar de residência várias vezes. Nesses sete anos, trabalhou em várias empresas. De motorista, acabou se especializando como construtor de obras. No estado, morou em Alvorada e Porto Alegre. Depois, mudou-se para Santa Catarina e, ao regressar ao Rio Grande do Sul, instalou-se em São Leopoldo, onde foi contratado para trabalhar como mestre de obras na construção da ponte do Rio dos Sinos.

Com o fim da Ditadura, Gerson Baiano decidiu fixar residência na região metropolitana. Com muito custo comprou um terreno em São Leopoldo. “Fui o quarto morador da Brás. Naquela época paguei muito dinheiro pelo terreno, o que equivale hoje a uns 15 mil reais”, lembra. “Quando minha casa estava quase pronta, deu uma enchente e cobriu toda a construção. Fiquei sem nada.” O episódio, juntamente com a falta de infra-estrutura o levaram, em 1980, a retomar a militância e a criar a Associação de Moradores da Vila Brás. Com o apoio da comunidade e a solidificação da associação, conta, “passamos a pressionar os políticos com mais autoridade e aos poucos o cenário da Brás foi se modificando”.

Hoje, Gerson Baiano é mestre de obras da prefeitura de São Leopoldo, mas conta que nunca foi ligado a um partido e tampouco deu importância para isso em suas ações na comunidade. “Na Brás, nunca arrecadamos votos para políticos. Sempre trabalhamos para conquistar melhorias para a comunidade”, afirma.

Casamento

Gerson Baiano casou-se duas vezes. Do primeiro casamento, que durou quatro anos, teve dois filhos. Da segunda união, nasceram outros cinco. Há um ano, ele ficou viúvo e ainda lembra com emoção e saudade da esposa. “Ela era uma pessoa exemplar. Sempre segurava a barra lá em casa e ainda me acompanhava na militância política. Foi uma perda lamentável.” Ele conta que até hoje não consegue compreender a morte da esposa. “Em março do ano passado, sofremos um acidente de carro. Fomos para o hospital, mas ela logo foi liberada e eu fiquei internado por alguns dias. Quando voltei para casa, ela estava ruim. Levei ela para o hospital Centenário e constaram que ela tinha uma cirrose hepática. Ela ficou um mês internada e faleceu”, conta.
Hoje, Gerson mora com uma filha e o genro.

A família de Baiano sempre foi muito católica, mas ele não segue nenhuma religião. “Acredito que existe um Deus maior. Mas não confio nas religiões. Elas pregam muita hipocrisia. Por trás das pregações, tem muito interesse. Todas as igrejas vendem a imagem de Cristo. Por isso eu não sigo nenhuma religião”, reitera.

Política

Como militante, ele conta que se orgulha de ver Lula na presidência. “Todos apostavam que o governo dele seria um fracasso. Mas ele foi o único presidente que enxergou o pobre. No início do seu governo, eu era contra o Bolsa Família, mas hoje vejo o programa como uma boa iniciativa para a população carente.”

Sonho e futuro

Gerson Baiano não tem muitos sonhos. Diz que aos 62 anos já conseguiu cumprir sua missão, ajudando as pessoas a construir uma vida melhor. Mas revela uma insegurança quando pensa no futuro dos filhos e netos. “Me preocupo com o futuro deles, pois hoje não temos políticos que garantam melhoria.”

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