Edição 348 | 25 Outubro 2010

Guerra cambial: uma disputa entre gigantes

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Patrícia Fachin

IHU On-Line – Então o Brasil tem mais a ganhar com a valorização do yuan?

Guilherme Delgado –


IHU On-Line - Quais as consequências para a economia global caso um acordo cambial entre China e Brasil se torne real?

Guilherme Delgado –
Essa relação Brasil X China tem muito mais a ver com a oposição face aos EUA porque eles ainda são a única moeda de reserva mundial e têm uma estratégia de emissão crescente dessa moeda de reserva com o fito de resolver problemas internos. Os EUA têm um déficit público monumental, em parte, em função da ajuda que teve de dar aos bancos.


IHU On-Line – E como a guerra cambial afeta programas sociais como o Bolsa Família?

Guilherme Delgado –
O Bolsa Família é um programa periférico, embora seja importante para as pessoas que recebem esse dinheiro. Mas é um programa pequeno e restrito do ponto de vista do impacto macroeconômico, por mexer com 0,5% do PIB, embora atinja 12 milhões de famílias. O programa é afetado porque se têm menos recursos fiscais. Mas, diria que 0,5% do PIB se resolve fazendo-se inversões de recursos. O problema todo é a política social de conjunto, que paga benefícios monetários e não monetários na previdência, na saúde, na educação, na assistência social e no desemprego. Ela representa praticamente ¼ do PIB. Então, o que está em risco é o conjunto da política social.


IHU On-Line - Serra tem anunciado em sua campanha eleitoral que irá aumentar o salário mínimo para R$ 600,00 caso seja eleito? Ele sempre foi favorável ao ajuste fiscal e agora promete reajustes salariais. Na atual conjuntura, é possível fazer esse reajuste?

Guilherme Delgado –
Serra está fazendo uma proposta oportunista, mas que não é inviável. O salário mínimo é de R$ 520,00 e o crescimento do PIB desse ano será em torno de 7%. Com a inflação em torno de 3,5 ou 4% e o incremento nominal de dez pontos percentuais, o salário mínimo passaria de R$ 520,00 para R$ 590,00 e seguiria o padrão de crescimento do PIB nominal. Então, a proposta do candidato é a mesma tese que já vigora no governo atual. A diferença é que o PT está tendo dificuldade de se comunicar com o público. Para o ano de 2011, daria um reajuste de 10% no salário mínimo, isso significa quase R$ 590,00. Isso não é impossível de fazer; mas Serra foi oportunista no sentido de anunciar essa proposta para um ano só, enquanto a política do governo Lula é baseada em critério de reajuste de salário mínimo em função do PIB do ano anterior, numa forma mais permanente. Serra está conseguindo, na mídia, mostrar uma imagem que o governo deveria estar mostrando, mas não está conseguindo. A política de valorização do salário mínimo que o governo Lula adotou a partir de 2004 é essa: crescimento de salário com base no crescimento do PIB real. Dilma ficou preocupada demais com o aborto, tema que do ponto de vista eleitoral não tem essa importância toda.


IHU On-Line - Dependendo do resultado das eleições presidenciais, como será conduzida a política cambial?

Guilherme Delgado –
A candidata Dilma se encaminha para fazer a reforma tributária. Logo, essa proposta tem de entrar na agenda do Congresso nos seis primeiros meses, que é quando o governo tem seu estado de graça e uma maioria parlamentar indiscutível. Minha preocupação é o conteúdo dessa reforma, porque tem várias naturezas e orientações. A reforma tributária de 2008, do governo Lula, feita pelo grupo do Palocci, era muito ruim. Penso que o novo governo terá de fazer um ajuste fiscal à força, no sentido de ter uma certa governabilidade sobre os gastos correntes. Se a economia continuar a crescer no padrão de 5 a 7%, tudo fica mais fácil porque, quando a economia cresce, a arrecadação também aumenta. Se tiver uma parada no crescimento econômico, aí terão de discutir as prioridades. Na realidade, esse discurso do ajuste fiscal como peça de resistência é para os economistas conservadores. A solução para essa questão está muito mais na direção de uma reforma tributária do que nas políticas conjunturais. É preciso uma reforma que socorra os fundos necessários para prover os direitos sociais e o financiamento da política social regulamentada na constituição.


BOX

Leia Mais...

> O economista Guilherme Delgado já concedeu outras entrevistas à IHU On-Line.

• A volta do Projeto Ômega. Entrevista publicada em 7-7-2010

• Anistia fiscal permanente: um ato de corrupção. Entrevista especial com Guilherme Delgado, publicada em 25-7-2009

• 'Há dólar demais no sistema econômico brasileiro'. Entrevista publicada em 15-7-2007

• “Energia Elétrica: esse é que o grande constrangimento para viabilizar o crescimento de 5% ao ano”. Entrevista publicada em 12-01-2007

• Crise financeira internacional: o melhor é esperar. Entrevista publicada na edição 233, publicada em 27-08-2007



Leia Mais...

>> Ainda sobre economia e temas abordados nesta edição, confira as publicações a seguir.

• A crise da zona do euro e o retorno do Estado regulador em debate. Edição 330, de 24-5-2010

• Euclides da Cunha e Celso Furtado. Demiurgos do Brasil. Edição número 317, publicada em 30-11-2009

• O capitalismo cognitivo e a financeirização da economia. Crises e horizontes. Edição número 301, publicada em 20-7-2009

• O mundo do trabalho e a crise sistêmica do capitalismo globalizado. Edição número 291, de 4-5-2009

• A crise capitalista e a esquerda. Edição número 287, publicada em 30-3-2009

• A financeirização do mundo e sua crise. Uma leitura a partir de Marx. Edição número 278, de 21-10-2008

• A crise financeira internacional. O retorno de Keynes. Edição número 276, de 6-10-2008

 

 

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