Edição 347 | 18 Outubro 2010

“O processo de construção do voto religioso é perverso”

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Graziela Wolfart

 

IHU On-Line - Em que sentido a internet foi novidade no cenário eleitoral deste ano?

Antonio Fausto Neto - A internet sem duvida é uma novidade, pois gerou ampla forma de conversação. Ou seja, as tecnologias digitais foram transformadas em meio, segundo vários usos, mediante estratégias, que lhe conferiram um novo papel neste contexto político-comunicacional. Vale observar que um dos resultados desta experimentação é, sem dúvida, a luta que se travou neste ambiente, através de sentidos vários que circularam com nível apreciável de silêncio, e ensejando mistérios a serem aclarados.

IHU On-Line - Como o senhor avalia o fenômeno do pastor Silas Malafaia, que afirmou: “Lula pode dar o escambau, mas temos nossas crenças e valores, que ditam as nossas atitudes. Os evangélicos entendem que, se prosperaram, não devem a Lula. Devem a Deus. Lula foi apenas um instrumento”? Aqui lembrando que ele é chamado de “telepastor” pela influência que exerce pela TV e rádio também...

Antonio Fausto Neto - O pastor tem razão, pois está coerente com uma visão mediadora sobre a qual os atos e mensagens se constituem. O presidente Lula não tem o poder de fazer uma nação pensar segundo a sua vontade. Isto é impensável. Mas ele é um ator de um campo no qual desenvolveu uma obra sobre a qual ele pode tomá-la como referência para fazer pedidos a seus pares, especialmente àqueles caros para a política, como são os “pedidos de reconhecimento”. E, certamente, apresenta índices de tanta popularidade e tão expressivas, que pode fazer esse pedido. Se os mesmos são correspondidos, isto é outra coisa. Certamente, a resposta pertence aos desígnios de Deus. Mas Deus leva em conta o trabalho dos mediadores.

IHU On-Line - O que representa, do ponto de vista midiático e religioso, a presença de Serra e Dilma em Aparecida, na última terça-feira?

Antonio Fausto Neto - Quando se utilizam os emblemas de outros campos sociais, isso se faz em vista da busca de reconhecimento, e especialmente a dinamização destes atos por parte dos dispositivos, como os de natureza midiática. Afinal de contas, as eleições estão subordinadas a um calendário muito mais complexo de um povo, como é o caso de sua agenda religiosa. Outra questão é a leitura que os indivíduos fazem. Vivemos em meio a registros simbólicos e dos efeitos dos contatos que se fazem, segundo as expensas da ordem simbólica. É um exemplo interessante deste encontro de lógicas.
 
IHU On-Line - Que mudança sinaliza o fato dos evangélicos terem se tornado atores políticos no Brasil?

Antonio Fausto Neto - Do ponto de vista teórico, significa que os atores formulem com engajamento próprio seus pleitos, e que procurem ter clareza sobre o destino de suas teses: quando são apenas insumos que vão se tornando instrumentalizações para teses de outras motivações. Ou, quando, de fato, são levadas em conta pela pertinência de suas causas. E pelo reconhecimento intrínseco dos seus valores.

Leia mais...

>> Antônio Fausto Neto já concedeu outras entrevistas à IHU On-Line:

* A midiatização e os governos latino-americanos. Entrevista publicada nas Notícias do Dia do sítio do IHU, em 21-09-2009;
* “A midiatização produz mais incompletudes do que as completudes pretendidas, e é bom que seja assim”. Entrevista publicada na revista IHU On-Line do site do IHU, em 13-04-2009;
* As relações entre mídia e política no espaço público. Entrevista publicada nas Notícias do Dia do sítio do IHU, em 29-10-2006;
* As estratégias midiáticas da religiosidade contemporânea. Entrevista publicada nas Notícias do Dia do sítio do IHU, em 22-05-2006.

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