Edição 346 | 04 Outubro 2010

''O mundo começa a partir da casa da gente''

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Graziela Wolfart e Moisés Sbardelotto

 

IHU On-Line - Em outubro deste ano, organizações ambientais internacionais estão organizando a campanha 10:10:10, o dia da maior mobilização local contra as mudanças climáticas em todo o mundo. Qual a importância de iniciativas mundiais, porém locais, como essa?

André Trigueiro – Toda a campanha, toda a mobilização, como foi o Dia Mundial Sem Carro, que houve pouca adesão, mas muito debate e reflexão, são processos. As campanhas se prestam a alertar, advertir, chamar a atenção, ajudam no processo de consciência. E espera-se que, em algum momento, essa consciência se traduza em novas atitudes. Em última instância, o resultado que interessa é a nova atitude. Mas a humanidade não dá saltos. Então as campanhas adubam a mente, fertilizam as ideias à espera da colheita, que é o que interessa: novos hábitos, novos comportamentos, novos padrões de consumo, novas atitudes. Então elas são muito bem-vindas. Não podemos pensar no planeta descuidando da casa da gente, das compras que fazemos no supermercado, do lixo que descartamos, da forma como nos inserimos na cidade em que vivemos, da forma como tentamos transformar a cidade em que vivemos num lugar melhor, a forma como votamos, como nos comportamos no condomínio, no ambiente de trabalho. O mundo começa a partir da casa da gente e se desdobra nos demais cenários.

IHU On-Line - Em seu sítio (www.mundosustentavel.com.br), você percebe a existência de uma “teologia ambiental”, pois as tradições religiosas sempre se preocuparam em ratificar a presença do sagrado nas mais diversas manifestações de vida. Em um nível inter-religioso, quais seriam os pontos fundamentais e comuns dessa teologia, em sua opinião?

André Trigueiro – Toda a religião, por premissa, defende a vida, tenta explicar o sentido da vida e nos advertir sobre a importância de estarmos vivos e enaltecermos a condição de sermos seres viventes. Portanto, por uma questão de coerência, toda a religião, em tese, se defende esses princípios, deveria defender a sustentabilidade, esta entendida como sinônimo de harmonia, equilíbrio e de uso racional, prudente e inteligente dos recursos. Portanto, estou afirmando segundo aquilo que me foi possível acessar em termos de informação sobre diferentes tradições, que quem se diz religioso, por princípio, deveria ter apreço pela vida e, em decorrência disso, entendendo as leis que regem a vida e o universo, ter uma postura na direção da sustentabilidade. Praticar a sua religião significa se aproximar dos preceitos defendidos por ambientalistas ou ecologistas. Quem defende a vida não pode destruí-la. A teologia ambiental propriamente dita é a capacidade que alguns teólogos têm de buscar nas suas respectivas escrituras ou textos sagrados, na base de suas respectivas doutrinas elementos de convicção para sustentar no dia de hoje a tese de que a sustentabilidade vai ao encontro da fé. A prática da espiritualidade ou a prática dos preceitos religiosos que alguém adotou devem convergir no mesmo caminho apontado por ecologistas e ambientalistas. Não há diferença, é coerente. A espiritualidade contém todas as religiões. A pessoa pode ser espiritualizada e não ter nenhuma religião. Mas a religião, seja ela qual for, não contém toda a espiritualidade. A teologia caminha na direção de tentar entender os desígnios de Deus. E se Deus criou a vida, a natureza e nos criou, certamente não foi para que nós dilapidássemos isso com a capacidade que estamos tendo.

Leia mais...

>> André Trigueiro já concedeu outras entrevistas à IHU On-Line. Confira:

* O mundo não depende de um acordo da ONU para mudar, porque a mudança está em curso. Entrevista publicada nas Notícias do Dia do sítio do IHU em 03-01-2010;
* Fontes sujas compõem a matriz energética brasileira. Entrevista publicada nas Notícias do Dia do sítio do IHU em 05-12-2007.

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