Edição 343 | 13 Setembro 2010

Foucault e o direito dos governados

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Márcia Junges | Tradução Benno Dischinger

 

IHU On-Line - Quais são os principais mecanismos do biopoder que se expressam no direito dos governados?

Frédréric Gros - Como acabamos de ver, o biopoder é duplo: ele está presente nas formas de dominação, mas também na resistência. Assim, entende-se bem que, no direito dos governados, o que vai expressar-se é o direito no sentido de Espinosa : uma energia vital. A vida, de fato, embora seja explorável, como vimos, é também resistência e criação de formas. O biopoder que o direito dos governados expressa é, portanto, duplo: de um lado, trata-se de se revoltar contra as opressões, de denunciar o intolerável, de condenar aquilo que violenta a vida e sua realização; de outro, trata-se também de inventar novas formas de vida, de criar estilizações inéditas da existência. A vida, então, é sempre resistência e criação ao mesmo tempo.

IHU On-Line - Em que medida podemos falar de “autogoverno” e autonomia numa sociedade onde o biopoder é tão preponderante?

Frédréric Gros - Em nossas sociedades, o biopoder, como domínio exercido sobre a vida dos indivíduos, é, de fato, muito importante. Quero dizer com isso que são inúmeras as formas de invasão de nossas vidas por solicitações e pressões que têm por função fortalecer as grandes forças econômicas e políticas. Por exemplo, em seu curso intitulado Nascimento da biopolítica, Foucault mostra como o capitalismo gestor da Escola de Chicago faz um apelo a todos para que se tornem empreendedores de si mesmos, para construírem suas vidas como um empreendimento. Observa-se, assim, que o neoliberalismo não tem somente efeitos políticos ou éticos. Cada qual é convidado a construir uma relação consigo mesmo de acordo com a modalidade capitalística dominante (o empreendimento), o que significa que, em suas relações sociais e em seu lazer, o sujeito deverá perguntar-se sempre: será que estou fazendo o investimento certo? Neste modelo, considera-se a si mesmo como um capital a ser valorizado. Entende-se que a força desse modelo está no fato de que ele supõe justamente a liberdade e a autonomia do sujeito. Mas a esta autonomia o neoliberalismo confere uma forma determinada: a do empreendimento. Portanto, trata-se menos de autogovernar-se do que de desgovernar, ou seja, aprender a libertar-se das formas de autogoverno que o poder pode nos levar a adotar.

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