Edição 342 | 06 Setembro 2010

Grandes grupos industriais são donos do Rio Uruguai

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Graziela Wolfart

 

IHU On-Line - Quais as principais questões políticas que envolvem a construção de barragens no Rio Grande do Sul?

Lucia Ortiz e Bruna Engel - São empreendimentos que da mesma forma que a construção de estradas, dão votos porque vendem a falsa ideia de desenvolvimento. Atualmente políticos e empresas renovaram o discurso na tentativa de vender a ideia da sustentabilidade, sem mudar a sua lógica de exploração da natureza. Os governos têm ajudado na organização e concentração dos atores do grande capital, planejando, promovendo e financiando com dinheiro público as grandes obras das mesmas grandes indústrias que financiam as campanhas eleitorais, de direita ou de esquerda. A concentração da produção de celulose, o aço da Gerdau, o Pólo Petroquímico, assim como o parque industrial da região sudeste, exigem alta produção de energia. Apesar da pressão da sociedade por fontes alternativas, a falta de políticas de incentivo e planejamento para a produção descentralizada segue uma forma de criminalizar como cara as fontes mais sustentáveis de energia. Por outro lado, políticas publicas subsidiam energia cara e suja de termelétricas a carvão e nuclear e fortalecem a indústria das hidrelétricas.

IHU On-Line - Como os órgãos públicos responsáveis e os governos do estado têm lidado com a questão das hidrelétricas ao longo da história?

Lucia Ortiz e Bruna Engel - Quando no regime militar os governos eram totalmente favoráveis às hidrelétricas, os órgãos públicos responsáveis tinham pouca autonomia para barrar o processo de expansão da oferta. Atualmente, em regime democrático, a situação não mudou quase nada. O Estado, ao promover políticas desenvolvimentistas, com programas de aceleração do crescimento (os PACs), afeta a demanda por energia abrindo mercado para expansão da oferta. O PDE 2010 aponta aumento da produção de energia de 3.333 MW anuais para acompanhar as taxas de crescimento econômico. O desmonte e enfraquecimento dos órgãos públicos tem se intensificado na medida em que os investimentos em projetos de alto impacto ambiental aumentam. Casos de demissão semanas antes da emissão das licenças ou a troca de técnicos para outros setores são comuns em época de falta de diálogo entre os políticos, pesquisadores e a sociedade civil. O exemplo da Fepam, que alertou antecipadamente o IBAMA sobre a fraude da UHE Barra Grande em 2004, nos últimos anos foi gritante: de um órgão público ambiental exemplar para todo o Brasil em termos de qualificação dos seus técnicos e de transparência na obtenção de informações por parte da sociedade, virou um balcão de atendimento prioritário às empresas com casos de emissão de licenças prévias ao recebimento e análise dos estudos de impacto ambiental para a construção de barragens, onde os técnicos passaram a ser perseguidos e afastados dos processos de licenciamento ou de formulação de políticas como as que se discutem no Consema-RS.

IHU On-Line - Quais os principais danos que as hidrelétricas podem provocar à biodiversidade gaúcha?

Lucia Ortiz e Bruna Engel - A bacia do rio Uruguai se caracteriza por altas taxas de endemismo nos vales formados nas cabeceiras, no Alto Uruguai. A construção de lagos provoca a morte de populações de animais, a extinção de espécies endêmicas e a consequente perda da biodiversidade. A região abriga uma das maiores populações de araucárias, o pinheiro brasileiro, que está em risco eminente de extinção. O Salto do Yucumã, maior queda longitudinal do mundo e símbolo cultural, pode desaparecer com a construção de usinas como a de Itapiranga e Garabi, esta última com 2800MW, projetada para o rio Uruguai entre o Rio Grande do Sul e a Argentina, outro projeto da época do regime e que voltou um pouco reformulado, mas com o mesmo potencial de destruição que o anterior. Não se sabe ainda qual a exata localização da usina, sabe-se que está entre as províncias de Corrientes e Missiones do lado argentino e Garruchos do lado brasileiro. Só em solo argentino estima-se que cerca de 30000 pessoas serão atingidas pela obra. A projeção da área de alagamento é de 730km². As pessoas que vivem na terra manejam e resguardam agrobiodiversidade que pode ficar sob as águas em regiões importantes do nosso território.

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