Edição 373 | 12 Setembro 2011

Assistência social: a política que oportuniza o acesso a todos os direitos

close

FECHAR

Enviar o link deste por e-mail a um(a) amigo(a).

Graziela Wolfart



IHU On-Line - Em que medida o programa Bolsa Família tem modificado a realidade social no Brasil?

José Moroni - Os estudos apontam que o Bolsa Família, até o momento, é uma peça fundamental nas mudanças das comunidades, tanto do ponto de vista econômico, social e de “desenvolvimento”. Mas como o Bolsa Família não vem acompanhado de um programa de formação política para a cidadania, fica a pergunta: quando os “destinatários” do Bolsa Família começarão a exigir seus direitos e, portanto, começarão a pressionar para que todas as políticas públicas respeitem o pacto de 1988 de universalização dos direitos? Outro limite do programa é que ele só foi pensado no seu aspecto social e a própria pergunta reflete isso. E os demais aspectos como ficam? E os aspectos políticos? O Bolsa Família oportuniza a auto-organização da sociedade e a participação política? Acho que não. Neste sentido, ele é apenas um programa de transferência de renda e não de riquezas.

IHU On-Line - Como o senhor percebe o Sistema Único de Assistência Social - SUAS?

José Moroni - O SUAS é uma decorrência da Constituição de 1988 que dá status de Política Pública à Assistência Social. È também uma deliberação de todas as oito conferências nacionais de assistência social, portanto é uma conquista da sociedade. Penso que temos alguns desafios na implementação do SUAS: a Lei Orgânica de Assistência Social define a primazia do Estado na assistência social. Isso ainda não percebemos. O Estado até agora tem mais regulado a assistência social, mas quase não tem implantado serviços públicos. A maioria dos serviços ainda são praticados pela sociedade e ainda na concepção da caridade, da benesse e da filantropia. Temos ainda o desafio do financiamento. Não temos uma definição clara das fontes de financiamento. Não temos ainda uma definição do lugar das organizações de defesa de direitos e dos movimentos sociais no SUAS. Mas estamos num processo, às vezes, mais lento do que queremos, mas acho que foi feito muita coisa nos últimos anos.

IHU On-Line - Qual a importância, na prática, de dar o status de política pública à assistência social?

José Moroni - Até 1988 existia a ação social, como algo pontual, isolado, fruto da caridade das pessoas e quando existia no Estado estava aos cuidados da primeira dama. Com a constituição de 1988 a assistência passa a ser uma política pública que integra, em pé de igualdade, as demais políticas, especialmente de saúde e de previdência. Este é o conceito de seguridade social. Com isso, a assistência passa a ser um direito do cidadão e um dever do Estado.

IHU On-Line - Qual o impacto de uma nova definição da linha da miséria e da pobreza no Brasil, tendo como único critério a renda per capita da família?

José Moroni - Boa parte desta pergunta já foi respondida acima, só faltou uma questão importante. Penso que devemos construir outros critérios na definição da linha da pobreza, fazer uma cesta de critérios. Por exemplo, incluir a questão da moradia, do saneamento básico, da qualidade da educação, do acesso à saúde, enfim, do nível de acesso aos serviços públicos e serviços de qualidade.

IHU On-Line - O que ocorre quando a lógica social é subordinada à lógica econômica?

José Moroni - Acontece o que estamos vendo agora, que qualquer respiro do chamado mercado (este ente invisível que ninguém nunca viu, mas que comanda a mente de quem tem poder de decisão) vêm, às vezes conservadoras e mal intencionadas, dizendo que o governo tem que cortar gastos. Eles não dizem onde, mas é claro que para esta elite são nos programas sociais. Este é o exemplo mais visível da subordinação da lógica política à lógica econômica.

IHU On-Line - Como seria uma organização política dos “usuários” das políticas públicas?

José Moroni - Primeiro acho que devemos avançar na compreensão de quem são os “usuários” da assistência. Não podemos ficar reduzidos ao artigo 2 da LOAS. Isso remete ao papel da assistência. Para mim, deve ser a política que oportuniza o acesso a todos os direitos; é esta a especificidade da assistência. Portanto, os usuários da assistência são todos e todas que tem seus direitos violados. As organizações de defesa de direitos têm um papel importante, mas que não podem substituir o dos usuários. E as organizações dos usuários não têm uma organicidade como tem as de defesa de direitos. A sua forma de organização precisa ser mais livre, menos burocrática, mais horizontal. Mas precisamos avançar, e muito, esta compreensão na assistência social.

Últimas edições

  • Edição 552

    Zooliteratura. A virada animal e vegetal contra o antropocentrismo

    Ver edição
  • Edição 551

    Modernismos. A fratura entre a modernidade artística e social no Brasil

    Ver edição
  • Edição 550

    Metaverso. A experiência humana sob outros horizontes

    Ver edição