Edição 232 | 20 Agosto 2007

A leste de Bucareste, de Corneliu Porumboiu

close

FECHAR

Enviar o link deste por e-mail a um(a) amigo(a).

IHU Online

Nesta semana apresentamos o filme: A Fost sau n-a fost?, de Corneliu Porumboiu. Os filmes comentados nessa edição foram vistos por algum/a colega do IHU.

Ficha Técnica:
 
Nome: A leste de Bucareste
Nome original: A fost sau n-a fost?/12:08 East of Bucharest
Cor filmagem: Colorida
Origem: Romênia
Ano produção: 2006
Gênero: Comédia
Duração: 89 min
Classificação: livre
Direção: Corneliu Porumboiu
Elenco: Ion Sapdaru, Teo Corban, Mircea Andreescu 

 
Sinopse:
Dezesseis anos após a queda do ditador Nicolau Ceausescu, na Romênia, um apresentador de TV resolve fazer um debate em seu programa. Afinal, houve ou não houve uma revolução para derrubar Ceausescu? Seus convidados dão o cano e ele improvisa, chamando para debater um professor de História alcoólatra e um velhinho aposentado. No meio do programa, a conversa toma um rumo inesperado.

Reproduzimos a seguir, o comentário de Neusa Barbosa, publicado na página www.cineweb.com.br,  22/03/2007

Esta comédia romena venceu o prêmio Caméra D’Or, destinado ao melhor primeiro filme do Festival de Cannes, em sua edição de 2006. Usando a auto-ironia como pedra de toque, o jovem diretor e roteirista Corneliu Porumboiu desenvolve seu enredo a partir de um fato histórico fundamental na história de seu país: o 16º. aniversário da queda do dirigente comunista Nicolau Ceausescu, ocorrida em 22 de dezembro de 1989.

Desarmando qualquer solenidade, o cineasta delineia três personagens principais: um apresentador de TV vaidoso e mulherengo, Jderescu (Ion Sapdaru), um professor de História alcoólatra, Manescu (Teo Corban), e um velhinho aposentado, Piscoci (Mircea Andreescu), cuja maior preocupação é vestir-se de Papai Noel a cada Natal. O apresentador prepara um programa sobre o citado aniversário e convida algumas pessoas para o debate. Na hora H, ninguém pode vir e ele improvisa com o professor e o aposentado como convidados.

O programa caberia muito bem como um episódio do nosso “Casseta & Planeta”, a começar pela total incapacidade do câmera de manter os convidados e o apresentador em foco – o que se torna uma piada à parte dentro do filme, que tem como subtema a situação de penúria, abandono e incompetência da Romênia capitalista. Por ali, ao que parece, a queda do comunismo não rendeu o progresso esperado, o que é visível na aparência desolada das ruas e conjuntos habitacionais em que moram os personagens e na maneira precária com que se tocam todos os aspectos da vida cotidiana.

No debate, porém, o grande assunto é o heroísmo – ou a falta dele. Jderescu tenta saber de seus entrevistados, afinal, se houve ou não houve uma revolução em 1989. O povo foi às ruas em manifestações de protesto, causando a queda do ditador, ou só saiu de casa para comemorar depois de saber que ele tinha fugido do palácio em seu helicóptero? O professor, particularmente, tenta defender a tese revolucionária, colocando a si mesmo entre os que foram às ruas exigir a mudança do regime. Não demora muito, um telespectador telefona, desmontando a versão de Manescu e causando um tremendo desconforto. O velhinho, que não tem muito a comentar sobre nada, fica entediado com a conversa e resolve construir barquinhos de papel diante da câmera vacilante.

A memória é uma coisa capciosa e o mesmo acontece com a visão que um povo tem de si mesmo. Sem querer montar uma tese, A leste de Bucareste põe o dedo na que deve ser uma ferida séria na auto-imagem dos romenos – mas de maneira leve e irônica. O resultado é nada menos do que brilhante, apoiado num sólido roteiro e no desempenho de três atores realmente afinados”.
Humor corrosivo domina filme romeno


“Mais uma invenção de festivais e de críticos que adoram obscuridades!”, podem exclamar alguns. O fato é que, depois de orientais, iranianos e argentinos, o cinema romeno tornou-se a mais recente coqueluche em festivais e revistas especializadas. Em parte, pode-se creditar tanta atenção à entrada recente do país na União Européia.” O comentário é de Cássio Starling Carlos e publicado no jornal Folha de S. Paulo, 23-03-2007.

Segundo ele, “a chegada ao circuito comercial brasileiro de A leste de Bucareste permite, contudo, outra aproximação de uma produção que, apesar de limitada em quantidade, parece se pautar por ideais de provocação e de ruptura com códigos dominantes. Um tom de crônica e uma estética do improviso, um humor niilista e uma mirada constante no espelho em busca de respostas à questão "quem somos?" reaparecem neste primeiro longa de Corneliu Porumboiu”.

O filme de Porumboiu alcança – escreve o crítico de cinema -, além da dimensão histórico-política da atuação dos romenos, o status da verdade. Diante de imagens como as gravadas pela TV, a pergunta que se impõe é “existem fatos ou apenas versões?”. “Aconteceu ou não?”, questiona o título do filme no original (“A fost sau n-a fost?”).

Conduzido por um humor corrosivo que bebe diretamente na fonte do absurdo de Eugene Ionesco, A leste de Bucareste reconduz o cinema a uma salutar margem, de onde se pode se enxergar com clareza como se destroem e constroem mitos.

Últimas edições

  • Edição 552

    Zooliteratura. A virada animal e vegetal contra o antropocentrismo

    Ver edição
  • Edição 551

    Modernismos. A fratura entre a modernidade artística e social no Brasil

    Ver edição
  • Edição 550

    Metaverso. A experiência humana sob outros horizontes

    Ver edição