Edição 227 | 09 Julho 2007

Perfil Popular - Graziele Gonçalves

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Graziele Gonçalves tem apenas 19 anos. Mas já assumiu o papel de mãe dos dois irmãos mais novos e do seu próprio filho, um bebê de três meses. A vida lhe ensinou muitas coisas: aprendeu muito com a dor pela perda da mãe, com a alegria de gerar uma vida e com o convívio com algumas pessoas que ainda lhe fazem acreditar no ser humano. Leia, a seguir, a história de vida e a visão de mundo desta jovem que mora na Vila São Jorge, de São Leopoldo.

Graziele nasceu em São Leopoldo, no Hospital Centenário. Ela conta que sua infância não foi muito boa, porque “a mãe passava muito trabalho com o pai”. “Ele bebia, batia nela. É o que eu me lembro. Eu era a caçula dele. Ele batia nos meus irmãos, mas em mim não. Em compensação, meus irmãos passavam trabalho nas mãos dele.” Graziele tem uma irmã mais velha, que já é falecida, um irmão mais velho, que mora na rua, e dois irmãos mais novos, que ela cuida e cria: Maurício, de 8 anos, e Julia, de 7. Os pais dela já faleceram. O pai há cerca de 5 anos e a mãe há um ano. Atualmente, Graziele mora na Vila São Jorge, em São Leopoldo, com o marido, os dois irmãos pequenos e o único filho, Isak, de 3 meses. “Meu marido se chama Josimar, mas é conhecido como Robô, porque ele caminhava como um robozinho quando era pequeno. Ele é de Sapucaia, mas veio morar comigo aqui em São Leopoldo. A gente se conheceu no ‘som’, lá em Sapucaia. Estamos juntos há dois anos.” Josimar é servente de pedreiro, em São Leopoldo. Eles moram na casa que era da família de Graziele. Ela está desempregada. “Às vezes, eu faço faxina na casa de uma conhecida minha. Fiz curso de manicure também e faço as unhas dela de vez em quando”, explica.

Momentos marcantes
A mãe de Isak estudou até a sétima série do ensino fundamental, mas pretende continuar os estudos assim que for possível. “Quero fazer supletivo”, diz. Ela relembra os melhores e piores momentos de sua vida: “O que de melhor na vida me aconteceu foi meu filho e meu marido. E, para completar, meus irmãos morando comigo. De ruim, é que na hora do parto eu quase perdi ele. Também foi triste quando minha mãe faleceu. O Isak é uma alegria na minha vida. É bom ser mãe, porque eu dou bastante carinho, não fico sozinha”, descreve. O momento mais difícil da sua vida foi quando a mãe estava no hospital. “Eu fiquei cuidando dela até os últimos dias de vida. Pensei que a gente ia vencer, mas não conseguimos, porque ela faleceu.”


Graziele não vai à igreja e conta que não segue nenhuma religião. Mas sempre acreditou em Deus, porque “tudo o que eu peço pra Ele a maioria das coisas Ele me consegue. Quando eu fecho os olhos e peço, daqui a alguns dias sempre vem. Não é tudo aquilo, mas é um pouco do que eu peço. Esses dias eu pedi meu banheirinho. E tô conseguindo, já estamos fazendo nosso banheiro”, conta. Agora, a família pretende fazer uma casa nova. “É que onde nós moramos é de madeira e é muito fria, tem muito buraco, sabe? As tábuas estão apodrecendo e estamos tentando fazer uma casa de tijolos, que é melhor né?”, explica.

Sonhos
Sonhos? A jovem de 19 anos responde: “Não sei”. Mas, depois pensar por um tempo, ela consegue sonhar: “Acho que um sonho é ver meus irmãos criados, bem, estudando e eu ter uma qualidade de vida melhor, com uma casa minha, bem ajeitada, meus irmãos também bem ajeitados, estudando, trabalhando. Eu gostaria de trabalhar como manicure ou, se eu terminar os estudos, conseguir um serviço bem melhor. Eu queria fazer Recursos Humanos, mas cinco anos de faculdade é muita coisa”.

A jovem e o marido Josimar vivem bem, apesar das dificuldades. Grazi conta que a família dele mora em Sapucaia e “tem uma casa enorme”, mas mesmo assim o rapaz veio ficar com ela. “Ele não precisava trabalhar e está trabalhando para sustentar eu e meus irmãos. Eu falei com ele que não precisava disso, que ele podia ficar lá com o pai dele e vir, às vezes, dar uma pensão pro filho dele, o Isak. Mas ele não quer, ele quer ficar comigo. Eu perguntei se ele não se sente mal morando ali, com a gente. E ele disse que não. Adotou a gente como família dele.”  Os irmãos pequenos, Maurício e Julinha, estão estudando. “Ainda estamos nos acostumando a morar juntos. Com o Maurício a adaptação está sendo mais difícil porque ele quer andar na rua e a gente não deixa. Mas agora ele está seguindo as normas.” Graziele não tem contato com seu outro irmão, mais velho, que mora na rua. E explica a razão: “ele anda meio louco, por causa das drogas”. Pensando no futuro do pequeno Isak, Grazi deseja que ele termine os estudos, arrume um emprego e seja feliz. “Ser feliz é ter alguém ao lado, um serviço bom, e ter amigos” esclarece ela. Ao falar de política, Grazi é enfática: “Político é só por ter mesmo. Eles não têm culpa do mundo ser assim do jeito que é, né? Mas acho que é muito político e pouca ação”.

Graziele conheceu as irmãs Cristina Giani e Ana Formoso, da Comunidade Missionária do Cristo Ressuscitado, de São Leopoldo, no Colégio Amadeu Rossi, onde faz serviço voluntário aos sábados, ajudando a descascar frutas e verduras. Esse convívio fez com que Grazi não deixasse de acreditar e confiar nas pessoas. “Sempre tem algum ser humano bom. Como o meu marido. Eu acredito nele. E acredito nas irmãs também; elas são muito boas. Foi um anjo que enviou elas. Elas tentam ajudar as pessoas para que cresçam. Elas me ensinaram a amar o próximo e isso é importante”, constata.  

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