Edição 226 | 02 Julho 2007

“A vida no Second Life pode levar a uma supervalorização do mundo virtual”

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IHU Online

De acordo com o professor Cláudio Penteado, da Universidade Federal do ABC (UFABC), é possível observar no Second Life um ambiente ambíguo. De um lado, ressalta ele, o metaverso promove “um individualismo das pessoas que se fecham dentro do mundo virtual, limitando suas sociabilidades no mundo real”. Por outro lado, destaca Penteado, “os habitantes do Second Life acabam criando novas comunidades que em diversos casos extrapolam as fronteiras virtuais”.       

Penteado é Cientista Social formado pela USP (FFLCH), especialista em Teoria da comunicação (Pós-graduação Lato Sensu na Fundação Cásper Líbero, São Paulo). Mestre em Ciências Sociais pela PUC/SP e doutor em Ciências Sociais pela PUC/SP, atualmente ele é pesquisador do Núcleo de Estudos em Arte, Mídia e Política (NEAMP - PUC/SP), no qual participa de pesquisas de projetos temáticos FAPESP sobre política e as novas tecnologias.

Penteado desenvolveu a pesquisa Universo virtuais: estudos das sociabilidades presentes no jogo Second Life. Confira a seguir a entrevista concedida por e-mail, à IHU On-Line:

IHU On-Line - Por que o Second Life se tornou um fenômeno?
Claudio Penteado -
O Second Life se destaca como fenômeno inicialmente pelo seu rápido crescimento, agregando um número cada vez maior de habitantes. Mas creio que podemos considerá-lo um fenômeno por suas características pós-modernas, em que as relações sociais são “turbinadas” pelos avanços tecnológicos da tecnologia da informação e comunicação. Destaco nele pelo menos três fenômenos. O primeiro é econômico, à medida que um número cada vez maior de pessoas e empresas estão interessadas em desenvolver negócios no universo virtual. Lembro que recentemente aconteceu um evento, “Second Life que negócio é esse?”, que reuniu pessoas interessadas em participar das oportunidades econômicas por esse programa. O segundo é a necessidade humana de encontrar espaços para fugir das pressões sociais, e o terceiro é a formação de comunidades (processo de identidade).
 
IHU On-Line - Como se dá a sociabilidade em cidades digitais, no Second Life?
Claudio Penteado -
As sociabilidades podem ocorrer de diversas formas. A forma mais comum é pela relação “direta” avatar com avatar. Mas o Second Life também propicia outras formas como o envio de mensagens; a compras de objetos, de casas etc; o pagamento por serviços (utilizados pelo avatar); a venda de serviços; áreas de entretenimento; blogs; formação de comunidades virtuais; e até a possibilidade de ampliação da relação no mundo “off-line”.

IHU On-Line - No mundo virtual, as pessoas podem ser o que desejam. Alguns especialistas dizem que todos os usuários querem ser bonitos e ricos. Com a utilização constante do programa, as pessoas poderão ficar desiludidas ao tentar aplicar na vida real o que acontece na virtual?
Claudio Penteado -
Há perigos de viver uma segunda vida? Acredito que não existam perigos óbvios e de curto prazo. Contudo, a vida no Second Life pode levar a uma supervalorização do mundo virtual, no qual as atividades podem parecer mais interessantes. Outro perigo que vislumbro é a valorização excessiva das relações mediadas, que, apesar de serem importantes no contexto da Sociedade da Informação, acaba por restringir e limitar as relações diretas entre humanos. Somos seres emocionais, precisamos de contato humano, o que faz parte do processo da vida social.

IHU On-Line - Na sua pesquisa, o Second Life é apontado como um programa utilizado por usuários que tentam fugir da racionalidade. Que outros fatores levam as pessoas a optar por ter uma segunda vida?
Claudio Penteado -
O desejo de viver novas experiências, a pulsão de errância (conforme o pensamento de Maffesoli ) e a realização do duplo humano são alguns desses fatores. A tecnologia é fascinante, e o Second Life apresenta um mundo em que os conflitos podem ser facilmente resolvidos, pois as possibilidades são múltiplas. Contudo, o usuário somente tem a experiência virtual, ou seja, ele não se expõe fisicamente, ficando protegido por detrás da tela. As experiências são limitadas ao campo da virtualidade. Assim, posso afirmar que as pessoas também procuram a segunda vida para viverem situações que não viveriam no mundo real.

IHU On-Line - O sucesso do Second Life pode ser associado ao fenômeno do individualismo dos indivíduos na vida real?
Claudio Penteado -
Em parte, pois, de um lado, o Second Life promove um individualismo das pessoas que se fecham dentro do mundo virtual, limitando suas sociabilidades no mundo real. Por outro lado, os habitantes dele acabam criando novas comunidades que, em diversos casos, extrapolam as fronteiras virtuais. Portando, podemos afirmar que ele carrega um grau elevado de ambigüidade, característica da pós-modernidade.

IHU On-Line - O Second Life é o novo espaço para a exploração econômica na rede?
Claudio Penteado -
Com certeza. Ele nasce dentro de um “espírito do capitalismo”. A Linden Lab, responsável pelo mundo virtual, tem objetivos econômicos com o desenvolvimento do mundo virtual. A expansão é uma estratégia, que parece estar dando certo, de conquistar uma situação de referência em todo mundo, valorizando seus espaços para os investidores. Pode-se perceber este objetivo no próprio site oficial do Second Life, o qual oferece inúmeros serviços e informações sobre a economia e negócios dentro dele. Também podemos observar esse movimento pelas diversas reportagens sobre o Second Life, que informam que determinada empresa entrou no mundo virtual (por exemplo: Petrobrás, IBM, Reuters, Toyota etc.).

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